Matéria originalmente produzida para a
Revista Ateneu nº2 – janeiro de 2020
No início dos anos 2000, tive acesso ao livro Desvendando Sete Cidades, essa que é uma das várias obras do notável pesquisador piauiense Reinaldo Coutinho. Posteriormente tive o prazer de conhecê-lo e estreitar a amizade, ao ponto de nos tornarmos parceiros, e hoje, o Portal Piracuruca conta com um vasto acervo desse grande escritor. Entre as matérias desse livro, uma delas me chamou a atenção: O fenômeno solsticial de Sete Cidades.
No dia 21 de junho às 5:50 horas, o sol desperta lentamente no oriente. As impávidas camadas de nuvens logo acima da linha do horizonte retardam por alguns minutos o grandioso espetáculo. Ocorre então um caprichoso jogo de formas com as nuvens baixas que assumem cores avermelhadas e formatos lenticulares. De repente, despertantes e esplendorosos, os primeiros raios solares começam a iluminar o horizonte e gradualmente ocupam o espaço vazio do furo solsticial.
À medida em que o disco solar ascende, emoldurado pelo orifício, um facho de luz lentamente “escorre” pelo solo do pátio, rumo ao portentoso pilar, a cara do diabo.
Ao cabo de alguns minutos, às 6 horas, o sol ocupa inteiramente o furo solsticial e irradia esplendoroso e extremamente ofuscante.
Amanhecer do dia 21 de junho no mirante solsticial da Terceira Cidade.
Incidência solar passando pelo furo solsticial do Parque Nacional de Sete Cidades.
Foco do raio solar é refletido na rocha, após passar pelo furo solsticial. Isso representa o momento do apogeu do acontecimento.
Esse trecho extraído da citada matéria, povoou a minha mente por muitos anos, sempre planejando presenciar esse fenômeno que ocorre na terceira cidade do Parque Nacional de Sete Cidades, até que esse ano de 2019, ciceroneado pelo guia Osiel Curiólogo e pelo aventureiro Índio Apache, pude presenciar esse acontecimento fantástico, tal qual foi descrito pelo mestre Reinaldo Coutinho. Na ocasião, produzi um vídeo documentário que está disponível no canal www.checkinaventura.com (link abaixo).
Vista do paredão rochoso na Terceira Cidade, destaque para o furo solsticial, onde ocorre a incidência solar.
O fenômeno solsticial que acontece nas Sete Cidades, ocorre também em alguns monumentos megalíticos de outras civilizações espalhadas pelo mundo, entre eles, o mais conhecido é Stonehenge na Inglaterra. No caso de Sete Cidades, o furo solsticial está alinhado com o nascer do sol no Trópico de Câncer, que é o solstício de inverno no hemisfério sul.
Para os antigos habitantes da região, esse acontecimento marcava o início de um novo ano e servia de indicativo para estabelecer o começo da estação seca e, consequentemente, o calendário agrícola, regulando as épocas de derrubada, semeadura, colheita e até o florescimento de frutos silvestres, além de servir para determinar ciclos reprodutivos favoráveis para a caça e a pesca. Também, provavelmente nesse cenário, ocorriam rituais.
Registros rupestres nas imediações do furo solsticial, foram deixados pelos antigos habitantes mostrando através de um desenho na rocha, um conjunto de retas paralelas, simbolizando os raios solares que incidem em várias direções durante o ano, uma dessas retas atinge uma figura em formato quase circular, simbolizando o furo solsticial.
Pintura rupestre deixada pelos povos primitivos, simboliza a dinâmica da ocorrência do fenômeno.
É sem dúvida um espetáculo incomum e emocionante, que pode ser acompanhado em sua plenitude sempre no alvorecer do dia 21 de junho, na medida do movimento natural do sol, a luz que reflete sobre a rocha vai regredindo, deixando ao final, o relógio solar dos antigos habitantes das Sete Cidades do Piauí.
A incidência solar deixa na rocha uma orientação temporal, é o Relógio Solar.