Rumbora que é hora de cantar o Hino Nacional! Um retrato das escolas públicas nos anos 1980

Texto publicado no Piagui Virtual em 1 de março de 2019

Lembro bem, todas as manhãs antes das aulas na Unidade Escolar Anísio Brito em Piracuruca, início dos anos 1980, Dona Francisca tocava o sino, era o sinal de que ali iniciava o nosso compromisso, era hora de guardar as bolas de gude (chamadas por nós de peteca) e irmos direto para aquele local reservado da nossa turma, perfilados, tão acostumados com o ritual que já sabíamos o nosso exato lugar de ficar (em forma), a disciplina ali já estava correndo nas nossas veias.

Ao menor sinal de distração ou brincadeira, bastava um olhar da Dona Francisca ou da Diretora Maria Alzira, elas não precisavam falar nada e o moleque já ficava em uma postura quase militar; época em que imperava algo que falta hoje nas escolas, o tal respeito; não era um colégio militar, era uma escola pública, um grupo escolar mantido pelo Governo do Estado. Têm mais, outros hinos eram cantados dependendo do período, como o Hino da Independência, o Hino à Bandeira e o Hino do Piauí.

Tal costume foi sumindo nas escolas, até quase não existir mais e na mesma proporção foi aumentando o desrespeito pelo professor e demais profissionais da educação dentro das escolas, nesse tempo ao qual me refiro acima, raridade era quando um colega respondia mal ou destratava um professor e quando assim fazia os pais logo tinham conhecimento, pois havia a reunião de pais e mestres para tratar desses assuntos, portanto, o Hino Nacional para mim é a representação simbólica de todo um contexto e um período onde o aluno sabia exatamente o seu lugar, seu papel e respeitava o professor.

Nas redes sociais hoje, o que mais circulam ou “viralizam” são opiniões sobre um ato do Ministro da Educação que solicitou que fosse cantado o hino nas escolas, não vou me ater aos demais itens dessa solicitação, por considerar um erro, o Ministro foi muito mal assessorado e a população reagiu prontamente. Quanto ao hino, pessoalmente sou pleno de acordo que seja cantado, que voltemos a ter esse momento de civilidade, aqui vale aquela máxima “se quiser mudar o mundo comece por você mesmo”,  penso que o sentimento patriota é algo que deve ser regado dentro do coração de cada uma de nossas crianças.

É triste ver como a repercussão dessa decisão talvez exagerada, mas acertada “em partes” tomada pelo Ministro cause até desdenho com relação ao Hino Nacional nas redes sociais, vi até distorções do hino com danças não adequadas para crianças, talvez quem faça comentários irônicos e promova a disseminação dessas distorções não tenha vivido na época acima e para elas o Hino Nacional é só mais uma música qualquer.

Não é só disso que a educação brasileira precisa, precisa de muito mais, mas vejo que tudo começa pelo respeito, na minha época de Unidade Escolar Anísio Brito, o cantar do hino era uma preparação de espírito, era acalmar, uma pausa para reflexão e tomar consciência de que a partir daquele momento algo de diferente aconteceria, era a hora de estudar, o respeito quando é cultivado traz bons frutos, para o cidadão e consequentemente para o seu país.

Quanto ao Governo Federal, sinceramente ainda não consigo cobrar, acho que dois meses é pouco tempo para se implementar e se perceber mudanças em algo tão complexo como a educação brasileira, precisamos valorizar o professor, melhorar a estrutura das escolas, ter responsabilidade com a distribuição de livros, transporte de alunos e de merenda escolar, são tantos desafios para problemas que não começaram no dia 1º de janeiro de 2019 e envolve também os governos municipais e estaduais. O que a educação brasileira é hoje foi sendo construído na medida em que o Hino Nacional Brasileiro foi sendo silenciando nas escolas.