A trajetória do “Coronel Progresso”, os 80 anos da morte de Lucas Meneses

Matéria originalmente produzida para a
Revista Ateneu nº2 – janeiro de 2020.

O ano de 2019 marcou para Piracuruca os 80 anos da morte de Luiz de Morais Meneses, conhecido como Lucas Meneses. Lucas nasceu em Ibiapina-CE, por volta do ano de 1892, era filho de José Escórcio de Meneses (17/11/1849 – 11/05/1920) e de Joana de Morais Meneses (23/07/1862 – 29/02/1932). Sua ascensão comercial, social e política deu-lhe o status de homem notável. Uma trajetória vitoriosa que foi interrompida no final dos anos 1930, precisamente no dia 22 de agosto de 1939, quando aos 47 anos, faleceu, vítima de um trágico acidente na então Capital Federal, a cidade do Rio de Janeiro.

Luiz (Lucas) de Morais Meneses (13).

Dado à sua importante colaboração para a cidade de Piracuruca, com relevantes ações realizadas na primeira metade do século passado, esse artigo busca agregar alguns registros dispersos em livros, acervos da internet e até mesmo tradição oral, com o objetivo de sistematizar a biografia de Lucas Meneses e também, principalmente, revelar detalhes ainda não difundidos sobre a sua morte.

Retrato do cotidiano da antiga Piracuruca (10).

Lucas Meneses casou-se em 10/01/1915, com Carlota de Assis Morais Brito “Meneses” (04/10/1897 – 08/03/1992), era filha do Capitão Theóphilo de Moraes Brito e Florência Cardoso de Brito. Portanto, Carlota era neta do Senador Gervásio de Brito Passos. Tiveram três filhos, também já falecidos: Francisca (31/08/1917 – falecida), Theophilo de Moraes Meneses (08/01/1921 – falecido) e Francisca (Francy) de Brito Meneses (1/6/1929 – 13/12/1943). Na época do seu falecimento, seus filhos eram menores de idade. Foi um competente homem de negócios, comerciante bastante empreendedor, destacou-se como exportador de gado e de cera de carnaúba (1,2,3).

Francy (no terraço do castelinho). Fracy faleceu vítima de febre tifóide (16).
Francy (filha de Lucas Meneses) com os primos Vanda, Demerval e Antônio. Filhos de Olegario Machado (16).
O Jornal “A GAZETA” de 18 de dezembro de 1943 anuncia o falecimento de Francy (5).
Theophilo Moraes Meneses (16).
Retrato do filho Theophilo, registro de 30 de novembro de 1945 (15).

No Almanak Laemmert (Admistrativo, Mercantil e Industrial – Rio de Janeiro), divulgado nos anos 1930, estão registradas as atividades comerciais de Lucas Meneses.

Destaque para as atividades comerciais exercidas por Lucas Meneses (5).

Como homem público em Piracuruca, Lucas Meneses fez parte do poder legislativo, no qual participou dos Conselhos Municipais de 1917 a 1920 (como suplemente) e de 1921 a 1924 (como titular), além de 1929 a 1932 onde foi vice-presidente desde Conselho (6).

Jornal Correio da Manhã – Rio de Janeiro, 11/6/1931.
Anunciando que através de Decreto do Governo Provisório, Lucas Meneses foi designado para suplente de Juiz Federal de Piracuruca (5).

Foi prefeito de Piracuruca por três vezes: A primeira, por nomeação, em 9 de agosto de 1933. No segundo mandato, foi eleito pelo voto popular, sendo então o primeiro prefeito constitucionalmente eleito de Piracuruca, em 18 de novembro de 1935. Finalmente, após o golpe do Estado Novo, em 1937, foi confirmado no cargo pelo Interventor do Estado Dr. Leônidas Melo (3, 6, 7).

Com grande influência política, Lucas Meneses foi um dos grandes responsáveis pela urbanização da cidade (1, 7). Às vésperas da Segunda Guerra, Piracuruca estava atravessando o seu melhor ciclo econômico, vendendo e exportando a produção dos seus carnaubais, construindo o seu grande mercado público e realizando o processo de urbanização, que começara com a abertura e regularização de novas ruas e avenidas. (2).

Recorte do Almanaque da Parnaíba de 1942 mostrando o Mercado Público Municipal de Piracuruca (4).
Placa existente no Mercado Público Municipal de Piracuruca.

De fato, no tempo em que Lucas Meneses esteve à frente do poder público, Piracuruca prosperou. O comércio teve significativo impulso e, dentro deste processo modernizador, em 1937, em pleno governo de Getúlio Vargas, o prefeito Lucas Meneses, deu início à construção do Mercado Público Municipal, sendo terminado na gestão de Dr. João Fortes de Siqueira, em 1941, embora inaugurado por Antônio José de Sousa, no ano de 1942. Portanto, após a morte de Lucas Meneses. A inauguração se deu em plena Segunda Guerra Mundial, porém em clima de festa, com a presença de grande número de autoridades do Estado (1, 6, 7).

Recorte do Jornal Correio do Commercio – Rio de Janeiro, 26 de Novembro de 1937.
Destacando o envio dos telegramas de solidariedade ao então Presidente Getúlio Vargas, entre eles, o de Lucas Meneses (5).

Lucas Meneses pensava alto, incentivou a educação (7), em 1933, o então inspetor de ensino do Piauí, o piracuruquense Anísio Brito, autorizou Lucas Meneses a dar início à construção do Grupo Escolar Fernando Bacelar, a escola começou a funcionar em 1934 e tempos depois passou a se chamar Unidade Escolar Anísio Brito (6). Lucas Meneses contratou professores de Teresina para lecionar no Ginásio Piracuruquense, criado por ele. Destaque para os professores José Bittencourt (Bitte) Pereira e James Azevedo, contratados em 1936, foi nessa época que funcionou em Piracuruca a escola denominada “Ateneu” (2).

Recorte do Almanaque da Parnaíba de 1942 mostrando a Unidade Escolar Fernando Bacelar, tempos depois passou a se chamar Unidade Escolar Anísio Brito (4).

Durante o mandato de Lucas Meneses, várias obras foram construídas. Muito significativa foi a construção, em 1935, de um pequeno campo de pouso, onde semanalmente pousava o avião do CNB (Correio Nacional Brasileiro) (1, 7). O campo de pouso foi interditado por falta de condições confiáveis, após o choque do avião “Moreninho” em uma árvore (6). Em memória à construção desse campo de pouso, a Câmara Municipal de Piracuruca, através da Lei Ordinária (LO) 1.292/1991, de 5 de dezembro de 1991, denomina de Lucas Meneses, o Aeroporto de Piracuruca-PI (9).

Avião do CNB, pousando nos rincões do Piauí (8).

De acordo com (6), os documentos assinados por Lucas Meneses que foram encontrados são poucos. No entanto, tivemos acesso a uma carta enviada por Lucas Meneses, destinada ao patriarca dos Polidoro de Brito, essa carta está exposta no Memorial Polidoro de Brito, na localidade Saco dos Polidoros, Município de Brasileira-PI. Abaixo, temos uma imagem e a transcrição da carta.

Carta enviada por Lucas Meneses ao Sr. Polidoro de Brito. A data da carta carece de uma confirmação, aparentemente trata-se de 8/3/1936.

Em 1937, Lucas Meneses iniciou a construção de um suntuoso casarão conhecido como “castelinho” (3). Na época, os coronéis do ciclo da carnaúba despertaram para morar melhor oferecendo tal conforto a si e às suas famílias, construindo palacetes (7). Nessa ocasião, Lucas Meneses viajou para o Rio de Janeiro onde foi comprar os móveis para a sua nova residência. Mas, infelizmente, não chegou a morar nela por conta de seu falecimento, aos 47 anos de idade, vítima de acidente automobilístico na Avenida Beira Mar, em frente à Rua Ferreira Vianna, no Rio de Janeiro em 22 de agosto de 1939 (1, 2, 3, 7).

Lado esquerdo a construção do palacete que foi iniciada em 1937 e do lado direito após o término da construção.
Ainda hoje o casarão mantém seu aspecto original. É uma arquitetura que tem um inestimável valor histórico e muito atraente de se contemplar (3).

O ACIDENTE

Rio de Janeiro nos anos 1930, pano de fundo para os últimos momentos de Lucas Meneses (10).

De acordo com o atestado de óbito, as causas do acidente foram: Esmagamento da cabeça e do tronco, rupturas viscerais múltiplas. Os detalhes sobre aquele fatídico acidente foram noticiados em alguns jornais da época, aqui destacamos: Jornal Imparcial (MA), Correio da Manhã (RJ) , Jornal do Brasil (RJ) e Jornal do Comércio (RJ).

O Jornal Correio da Manhã (RJ), detalha mais o acidente, destacando o nome do hotel em que Lucas Meneses estava hospedado, assim como o dia em que ele deu entrada no hotel (3 de agosto), além do horário e local do acidente. A partir daí, sabemos que ele já estava no Rio de Janeiro há 18 dias. É revelado também a gravidade do acidente, que após sucumbir ao primeiro atropelamento, Lucas Meneses foi “esmagado” por vários outros carros, causando-lhe morte imediata.

Já o Jornal do Brasil, completa informando a idade de Lucas Meneses, que no momento chovia torrencialmente e que ao atravessar a via, Lucas Meneses foi colhido pelo veículo e atirado ao solo. O motorista evadiu-se e outros veículos, inclusive um ônibus, trituraram-lhe os ossos, portanto, Lucas Meneses teve múltiplas fraturas e morte instantânea.

Vejamos as notas e as transcrições:

O Jornal “O Imparcial” (SãoLuis-MA) noticia o fato de forma superficial, dois dias após o ocorrido (5).

O Jornal Correio da Manhã (RJ), noticia de forma mais detalhada o acidente (5).

Jornal do Brasil (RJ), “chovia torrencialmente…motorista evadiu-se”(5).

Flórida Hotel nos dia atuais (2021), local onde Lucas Meneses esteve hospedado no Rio de Janeiro (10).

Finalmente, dois dias após o acidente o Jornal do Comércio divulga que o corpo de Lucas Meneses está no necrotério da polícia da então Capital Federal (5).

Assim, a última passagem de Lucas Meneses pela prefeitura de Piracuruca foi traumática, a morte o colheu prematuramente e trouxe consternação e preocupação ao povo de Piracuruca, pois vivia-se à época, o Estado Novo e os temores da Segunda Grande Guerra (6).

A REPERCUSSÃO

O Diário Oficial do Piauí, de 18 de setembro de 1939, destaca a morte de Lucas Meneses, em nota de página dupla

Página dupla do Dário Oficial do Piauí de 18/09/1939. Logo abaixo temos a transcrição dos pontos de destaque.

Transcrição:

Cel. Luiz de Morais Menezes (12).

CORONEL LUIZ DE MORAIS MENEZES

Todo o Piauí sabe e sinceramente lastimou a morte, no Rio, do Coronel Luiz de Morais Menezes, Prefeito de Piracuruca.
O fato lastimabilíssimo, que enlutou um município, verificou-se no dia 22 de agosto próximo passado às 20 horas e 45 minutos, sendo o corpo do inditoso Prefeito embalsamado e embarcado para o Piauí no vapor Itapé, chegando em Fortaleza a 3 do corrente, de onde foi transportado, via terrestre, para Parnaíba e desta cidade para Piracuruca em carro especial da Central do Piauí. Acompanharam o corpo do ilustre filho de Piracuruca de Fortaleza até Parnaíba o seu cunhado Olegário de Morais Machado, Dr. Plínio Ramos e o telegrafista João Caneio. De Parnaíba até Piracuruca acompanharam-no: Dr. João Fortes Siqueira, Coronel Luiz de Brito Melo, João Fortes Portugal, Franciscpo de Brito Magalhães, Noé de Araújo Fortes, Josias Coêlho de Brito, D. Adalgiza Nunes Ribeiro, Senhorita Maria de Nazaré Ribeiro e Ubiratan Nunes Ribeiro.
Em Parnaíba foi o corpo exposto na capela da Santa Casa onde recebeu grande número de visitas de seus amigos permanecendo ali por espaço de seis horas.
Na gare da Estação de Piracuruca aguardava o corpo do coronel Luis de Morais Menezes grande massa popular, de todas as camadas sociais, calculada em mais de mil pessôas, tendo sido os seus restos mortais velados durante a noite por pessôas da família e grande número de amigos, até o momento do sepultamento, que foi efetuado no dia 5, às 17 horas, com avultado acompanhamento. Falaram à beira do túmulo sobre a personalidade do extinto, o Professor James Azevêdo, Dr. Valter Spíndola e o Prefeito Raimundo Ney Baumann que representou o Exmo. Sr. Interventor Federal e o Senhor Diretor das Municipalidades.

Em seu discurso, o Prof. James Azevêdo destacou:

…que saudade imensa deveis ter levado convosco dos parentes, dos amigos e da terra que vos embalou as alegrias de infancia e assistia agora a vertiginosa prosperidade que coroava de exito o vosso trabalho fecundo e honesto….

Já no discurso do Juiz de Direito da Comarca de Piracuruca, Bacharel Valter Spindola e Silva, destaca-se o seguinte:

…na sepultura, que temos deante dos olhos, meus senhores, desaparece o corpo de um cidadão digno entre os mais dignos de sua geração, que soube honrar e dignificar, de maneira admirável, a classe a que pertenceu, tornando-se, por assim dizer, um de seus máximos expoentes no meio em que vivera; desaparece o corpo de um cidadão que a esta terra, grande no facies de suas belêzas e béla no seu panorama de grandezas, legou o exemplo edificante do civismo, de honestidade a toda a prova e de grande amôr ao trabalho; de autentico chefe de familia, que sempre viveu para a esposa idolatrada e filhos queridos…

Portanto, o corpo de Lucas Meneses foi transportado de navio até Fortaleza, via terrestre até Parnaíba e de trem até Piracuruca, para ser enterrado em 5 de setembro de 1939 no cemitério Campo da Saudade, 14 dias após o acidente. Vários telegramas vindos do Rio de Janeiro, Fortaleza, Teresina e outras muitas cidades foram enviados à família expressando condolências, uma prova da popularidade e de o quanto Lucas Meneses era conhecido e estimado.

Velório de Lucas Meneses, 5/9/1939 (16).
Cortejo fúnebre de Lucas Meneses, 5/9/1939 (3).

Era um competente homem de negócios, espírito empreendedor e líder político ascendente, teria servido muitíssimo à Piracuruca se não fosse o acidente (2). Lucas Meneses deixou essa vida em plena ascensão pessoal e política, jovem ainda, aos 47 anos, tinha, pelo menos, mais 20 anos de vida pública, o que, dada a sua característica inovadora e de um gestor à frente do seu tempo, iria com certeza, influenciar positivamente os destinos de nossa Piracuruca.

Luiz (Lucas) de Morais Meneses (14).

Hoje, além de dar nome ao Aeroporto Municipal, a uma rua no Bairro de Fátima e a uma Clínica de Reabilitação ligada à APAE de Piracuruca, Lucas Meneses é patrono da cadeira 11 da Academia de Letras da Região de Sete Cidades (ALRESC). Também, em sua homenagem, sua irmã Adília de Moraes Meneses (Nenzinha), batizou de Luiz de Moraes Meneses, o seu filho nascido em 15/12/1942.

Luiz de Moraes Meneses (Luiz da Moageira), na foto à direita desse autor, Luiz faleceu em 6/10/2019.

Fontes consultadas (nov/2019):

1 – Revista Ateneu 2003
2 – Apontamentos Históricos da Piracuruca – Jureni Machado Bittencourt
3 – Portal Piracuruca – “Os castelinhos: a exuberante arquitetura antiga de Piracuruca” por Reinaldo Coutinho
4 – Almanaque da Parnaíba – 1942
5 – Hemeroteca Digital Brasileira
6 – Remexendo o Baú – Maria do Carmo Fortes de Britto
7 – Revista Ecoturismo Ed. 204 – 2011
8 – Almanaque da Parnaíba – 1935
9 – Relação das Leis Ordinárias, Complementares e Decretos promulgados pela Prefeitura Municipal De Piracuruca – Piauí
10 – Google Images
11 – https://www.facebook.com/Piracuruca-Reviver-Bons-Momentos
12 – Diário Oficial do Piauí, de 18 de setembro de 1939
13 – Fotografia obtida do acervo de Cleonice Meneses
14 – Fotografia obtida do túmulo de Lucas Meneses
15 – Fotografia do acervo do Sr. Raimundo Sobrinho
16 – Fotografia do acervo de Domingos Demerval