Eu sinto orgulho de ter comandado pracinhas tão heroicos. No início, nós não acreditávamos na capacidade do nosso soldado. No final, vimos que estávamos enganados…Nós comandamos uma tropa de bravos. Fomos a única tropa de Exército sul-americano a combater em solo europeu naquele conflito, tropa que retornou ao Brasil consagrada pelos resultados concretos alcançados.
General Evangelista.
Em 2021, produzi uma matéria para a Revista Ateneu intitulada “Os nossos heróis de guerra: em memória aos piracuruquenses que lutaram na 2ª Grande Guerra Mundial”. Nela consta a história de 4 piracuruquenses envolvidos neste evento que ocorreu entre os anos de 1939 e 1945 e que marcou a história da humanidade, são eles: Francisco de Sousa Primo, José Ribamar Cerqueira, Quirino Gomes da Silva e Francisco de Morais Meneses. Os 3 primeiros embarcaram para combater na Itália, enquanto o último não embarcou por questões de saúde.
Em tempo 1: logo abaixo deste texto, tem o link para a matéria supracitada, disponível também aqui no Portal Piauiando.
Uma característica comum entre o 4 pracinhas citados acima, é que todos moravam no Piauí na época da convocação para o combate, alguns estavam na ativa, servindo como soldados no 25º BC em Teresina, enquanto outros já haviam dado baixa do exército.
No entanto, estes 4, não foram os únicos piracuruquenses a embarcarem para a Itália na Segunda Grande Guerra, um outro piracuruquense se destacou mais do que todos os outros, principalmente pela patente de destaque que detinha entre os pracinhas. Descreverei a partir de agora, algumas linhas sobre o piracuruquense João Evangelista Mendes da Rocha.
João Evangelista Mendes da Rocha, nasceu em Piracuruca – Piauí, no dia 21 de novembro de 1916, é membro de uma tradicional família da cidade, seus pais são José Mendes da Rocha (1871 – 1950) e Raimunda Amélia de Andrade (1886 – 1950) (1). Ainda conforme (1), são seus irmãos, (todos in memoriam): Laura de Andrade Mendes da Rocha (1914–2007), Corinto Mendes da Rocha (1918–1999) e Lauro Mendes da Rocha (1920–1992). O casarão, morada dos Mendes da Rocha ocupava um lugar de destaque, na esquina da Praça Irmãos Dantas em Piracuruca, até sucumbir há poucos anos.

João Evangelista saiu de Piracuruca ainda jovem para o Colégio Militar do Ceará, onde começou a trilhar uma vitoriosa carreira no Exército Brasileiro. Já com 21 anos, em 22 de novembro de 1937, foi declarado Aspirante-a-Oficial da Arma de Infantaria. Este foi apenas o início de uma trajetória brilhante, que o levou à patente de General-de-Brigada do Exército Brasileiro(2).

Em (2), consta a seguinte trajetória do General Evangelista nas forças armadas:
Realizou, como oficial, os cursos de Técnica de Ensino e da Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais – EsAO. Como Aspirante-a-Oficial, foi designado para o 13º BC, Joinville – SC, e, em seguida, transferido para o 5º BC, Itapetininga – SP. Como 1º Tenente, foi transferido do 1º Batalhão de Fronteira (Foz do Iguaçu – PR) para o 6º Regimento de Infantaria (Caçapava – SP), Unidade integrante da 1a DIE, que fez parte do 1º escalão da FEB e onde permaneceu do começo ao fim da guerra.
Sobre a sua empreitada na Segunda Grande Guerra, em (2) é completado que:
Tomou parte diretamente nas operações de Camaiore, Monte Prano, Lama di Sotto, Montecavalloro, Boscacio, Soprassasso, Castelnuovo, Collecchio e Fornovo, assim como no ataque de Barga. Promovido a Capitão em dezembro de 1944, passou de Subcomandante da 2ª Cia / 6º RI ao comando da mesma.
Em (2), também constam alguns depoimentos do General Evangelista sobre a sua participação na FEB – Força Expedicionário Brasileira, durante a Segunda Grande Guerra, seguem alguns trechos:
A partida para o combate:
A minha designação para a FEB deu-se quando eu servia no 1º Batalhão de Fronteira, Foz do Iguaçu, e fui transferido para o 6º Regimento de Infantaria. Este Regimento, sediado em Caçapava-SP, tinha um Batalhão em Taubaté e outro em Pindamonhangaba. Para este último eu fui designado. Como era 1º Tenente e mais antigo, por falta de capitães, sempre comandei Companhia.
…
O embarque foi uma total surpresa. Recebemos ordens de nos aprestarmos para realizar manobras. De repente, seguimos para a Estação da Vila Militar e, neste local, embarcamos em seis ou sete composições ferroviárias, às quais foram diretamente para o Cais do Porto. Isso foi no dia 29 de junho de 1944. O embarque da tropa finalmente se deu no Rio de Janeiro em 2 de julho. A conduta da tropa foi modelar. Não houve pânico nem indisciplina. Todos estavam conscientes da ida para a guerra e do dever a ser cumprido.
…
A viagem foi tranquila. Apenas uma vez houve ameaça de submarino. Lembro-me de que todos, em expectativa nervosa, ficamos durante três ou quatro horas, cada grupo em seus botes, prontos para lançamento ao mar. Felizmente, nada de anormal aconteceu.
A chegada ao campo de guerra, na Itália:
No dia seguinte de nossa chegada a Nápoles, houve um bombardeio alemão ao cais da referida cidade. Eles erraram por 24 horas. Nós já estávamos acantonados.
…
Nossa estreia no front deu-se na noite de 15 para 16 de setembro de 1944, com natural nervosismo para uma tropa estreante.


Os nossos soldados, foram heróis:
Falar sobre a campanha implica citar o nosso soldado, homem simples, de porte médio e modesto, que se agigantou na guerra, apesar do precário treinamento.
…
Por incrível que pareça, quando se engajaram em combate e tomaram consciência de que representavam o Brasil, numa guerra em solo estrangeiro, ao lado de soldados de outras nações, eles criaram alma nova e foram bravos e valorosos.
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Os nossos homens conseguiram também uma excelente adaptação ao clima. Neve, chuva e frio com temperatura de vários graus abaixo de zero. Para o frio nos pés, usavam unicamente o galochão forrado com feno e jornal. Assim, mantinham a circulação e evitavam o pé-de-trincheira. Recebemos também ótimos agasalhos dos americanos. Com a dureza do combate, terreno montanhoso, clima adverso e demais dificuldades, era lógico que as baixas acontecessem, causadas por ferimentos em ação, acidentes e doença.
…
Combatemos num terreno difícil, lama em quantidade, clima frio, com chuvas constantes e contra o melhor soldado do mundo, o alemão, um cumpridor de ordens. Em sua casamata, podia não estar o tenente ou outro superior, mas eles cumpriam a missão até as últimas consequências. Tivemos um exemplo na tomada de Soprassasso.
…
Os alemães usavam muita propaganda. Nossas posições ficavam cheias de panfletos por eles lançados. Alguns visavam a abater nosso moral, com os seguintes dizeres por exemplo: “Enquanto você está aqui guerreando, sua noiva está com outro no Brasil.” O nosso soldado, além de não dar a menor atenção àquela panfletagem, achava graça desse trabalho inútil do inimigo.


O General Evangelista também fala da perca de alguns companheiros em combate. Seguem alguns depoimentos:
Nós fizemos a guerra e jamais poderemos esquecer aqueles que foram sacrificados no cumprimento do dever, bem como os que tiveram atuação destacada. Foram muitos. Citando alguns, estarei homenageando os demais. Em Castelnuovo, por exemplo, a morte do cabo Romeu Casagrande. Gritando, apressadamente, eu o chamei: “Onde está o chefe da peça?” Ele tinha mais de dois metros de altura e se dirigiu em minha direção. Subitamente, ao se lançar no solo protegendo-se de um bombardeio, caiu em cima da mina fatídica. Eu assisti a tudo. Foi terrível. Pernas e braços voaram em diferentes direções. Isto aconteceu mais ou menos ao meio-dia de 5 de março de 1945. Foi impressionante: um corpo cheio de vida despedaçado desta maneira.
…
O 2º sargento Andirás Nogueira de Abreu. Faleceu em ação no dia 28 de abril de 1945, em Collecchio, quatro dias antes do término da guerra. Era um bravo, homem simples e tranquilo, sempre voluntário para qualquer missão. Morreu metralhado, crivado de balas ao investir sobre metralhadoras nazistas que flanqueavam o avanço da Companhia.
…
O soldado Abel Antonio Mendanha faleceu em ação no dia 29 de abril de 1945, em Collecchio, três dias antes do fim das hostilidades no Teatro de Operações da Itália. Tombou, cumprindo missão de mensageiro, sob forte bombardeio. Durante toda a guerra, em combate, mostrou calma, tenacidade, sangue-frio e desprendimento. Em Belvedere, após chegar de uma patrulha, ocultou o fato de estar ferido e apresentou-se voluntário para outra missão contra o inimigo. Ao ser escalado para a missão em que perdeu a vida, pediu insistentemente para falar comigo. Eu o recebi pensando que ele estava querendo, desta feita, furtar-se de seguir com a patrulha. Ao chegar a minha presença, disse, meio tenso, na sua simplicidade comovente: “Capitão, tenho um pedido para lhe fazer: Caso não volte, diga a minha mãe e minha família que, na FEB, cumpri o meu dever.” Eu respondi: “Abel, isso é mais uma patrulha, você já é um herói e sua família será avisada, mas nada lhe acontecerá. Parece que o Abel estava pressentindo a morte.
Após seu falecimento, eu escrevi para a família, mas não pude, lamentavelmente, ir visitá-la como pretendia. Abel da Rocha Mendanha não fez feio, ao contrário, portou-se sempre dignamente!
Além de ser um orgulho para os seus entes queridos, hoje, faz parte, com toda justiça, da imensa galeria dos heróis do Brasil!

Finalmente, a guerra terminou:

Ouvimos as rádios italianas: Finita la guerra in Itália. O nosso Batalhão foi mandado para uma cidade de nome Voghera e lá, em junho de 1945, realizamos um bonito desfile, a Parada da Vitória, sob entusiásticos aplausos do povo italiano. Vinho rosado em pleno desfile. Ressalto aqui, mais uma vez, o excelente tratamento daquele povo para conosco. De lá fomos para o Sul, em Francolise, e, desse local, nos deslocamos para Nápoles, onde embarcamos de regresso ao Brasil. A nossa recepção, no Rio de Janeiro, acho que foi uma coisa nunca vista. O povo invadia a formatura, abraçava-nos, chorava e nos carregava. No dia seguinte, na Vila Militar, ainda chegavam homens perdidos na véspera. Era tropa de São Paulo. Foi uma euforia!
…
Eu sinto orgulho de ter comandado pracinhas tão heroicos. No início, nós não acreditávamos na capacidade do nosso soldado. No final, vimos que estávamos enganados.
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Nós comandamos uma tropa de bravos. Fomos a única tropa de Exército sul-americano a combater em solo europeu naquele conflito, tropa que retornou ao Brasil consagrada pelos resultados concretos alcançados.
Em tempo 2: no anexo 1, eu transcrevo uma carta do então Capitão Evangelista aos seus comandados, companheiros da 2ª Cia. Fonte: Acervo Marlos Bessa.
Após a guerra, o General Evangelista serviu na 1ª Circunscrição de Recrutamento Militar, RJ; 9º BC, Caxias do Sul; 19º RI, São Leopoldo – RS; Diretoria de Ensino do Exército, RJ; 3º RI, São Gonçalo – RJ; 2º BIB, São Cristóvão – RJ. Comandou a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro. Em 1985, foi promovido a Coronel, chegando, em seguida, na inatividade, ao posto de General-de-Brigada. Na reserva, graduou-se em Administração Pública pela EBAP / FGV – RJ e em Problemas Brasileiros pela FCC / UFRJ (2).
Na literatura, o nosso General também foi autor dos seguintes livros: Senha e Contra-Senha, A Serviço do Brasil, E o Sonho Continua e Nacionalismo Tem Sentido, Sim! Passou a ser membro Efetivo e Perpétuo da Academia de Letras da Região de Sete Cidades (Piauí), ocupando a cadeira no 10.
Em tempo 3: no anexo 2, eu transcrevo um Capítulo do livro Nacionalismo tem Sentido, Sim!, onde o autor relata uma visita que fez, no ano de 2000, à Lagoa do Jacaré em Piracuruca, na ocasião, ele estava acompanhado de Waldemar de Moraes Meneses, irmão do meu avô Durval de Moraes Meneses. O General João Evangelista queria conhecer pessoalmente o lugar onde ocorreu um episódio em 10 de março de 1823, a chamada “Escaramuça do Jacaré”, esta escaramuça foi um prelúdio da grande Batalha do Jenipapo que ocorreu 3 dias depois em Campo Maior, era o Piauí nas lutas pela independência do Brasil. Fonte: Acervo F Gerson Meneses.
Dentre as condecorações que lhe foram outorgadas, pela sua participação na Segunda Guerra Mundial, destacam-se: Cruz de Combate de 2a Classe; Medalha de Campanha e Medalha de Guerra.

Em tempo 4: no anexo 3, eu transcrevo o texto existente no Diploma acima.
General Evangelista casou-se em 2 de janeiro de 1941 com a catarinense Wanda Caminha Bessa (1919 – 1994), com quem teve os seguintes filhos:
=> João Eduardo Bessa Mendes da Rocha, militar aposentado, chegou ao posto de Coronel do Exército.
=> Marlos Bessa Mendes da Rocha, professor universitário, aposentado
=> Márcio Bessa Mendes da Rocha, engenheiro mecânico aposentado, mas ainda atuante, trabalhando na área de armazenamento de petróleo e gás
O Prof. Dr. Marlos Bessa Mendes da Rocha, filho do General Evangelista, destaca dois documentos que expressam bem a grandiosidade da participação brasileira na guerra: a carta (anexo 1) e a medalha recebida por seu pai. Diz ele: “…no meu entender, ambas trazem a ideia do quanto foi valorosa a contribuição brasileira na Guerra, basta ver o quanto de sacrifício humano e de heroísmo ali estão expressos“.
O General João Evangelista Mendes da Rocha faleceu em 2001, deixando um grande legado, de civilidade, patriotismo e valorização de suas raízes, entre tantos outros virtuosos adjetivos.

Anexo 1
Companheiros da 2° Cia.
E o fim chegou. Repassando na mente de cada um, devem estar desfilando todos os fatos que culminaram nesse dia em que a Paz voltou a reinar de novo entre os homens. Sacrifícios, mortes, heroísmos, se sucedem nessa rememoração. Da inexperiência dos primeiros tempos, chegou-se à conquista ousada de objetivos fortes e resistentes nos quais as qualidades de veteranos, proficientes conhecedores da arte da guerra, se manifestavam em toda a sua pujança. Mas até aí, quanto foi exigido e, quanto deram os nossos soldados! Um inverno gélido e rigoroso, na imobilidade estática de posições defensivas, com o inimigo em situação dominante, resistindo tudo com o valor a pertinácia e de resistência acima de todas as intempéries e rigores da natureza. E a nossa Companhia, na parcela que lhe tocou, talvez não tenha se coberto de glórias vãs e falazes – estamos todos cumprindo um e o mesmo dever – mas revelou-se na sua bravura, na sua cooperação, eficiente, no desdobramento de suas atividades, sempre na vanguarda e nos postos de maiores sacrifícios. Tudo lhe foi exigido e a tudo correspondeu largamente. Agora que tudo já passou, este Comando não pode se sentir senão orgulhoso desses seus homens que sempre atenderam às suas ordens e comandos, em todos os momentos e situações, uma evidenciação clara de uma consciência de dever que enobrece e orgulha comandados e comandantes.
Começou um dia em setembro. Camaiore caiu. E a patrulha do Monte Prano, cuja história Já se escreveu, se ergue como um marco de ousadia e coragem na história de nossa Companhia. Pomezzano, S. Tochino, Matanno, eram os limites à frente da Cia. Só Quem escalou, só quem palmilhou as trilhas que para lá levam, sabe o que isso quer dizer. Depois, a frente mudou, Barga. Os nomes talvez ainda sejam familiares: Diecimo, Piano della Rocca, Coreglia. Passagens rápidas que não prenunciavam os sacrifícios futuros. E um dia se atacou e tomou Lama di sotto, di Soppra e Pradoscelli. Situação precária nos obrigou a um retraimento para Sommacolonia. Quem não se lembra dessa noite enluarada? E novamente, a frente foi mudada. Dias calmos de C. di Christo com o Outono se manifestando no amarelecimento das folhas e na nudez da paisagem. Ordem de avanço. E vêm o espectro do Soprassaso a nos assombrar todas as noites de um inverno sem fim, branco como todo o fantasma, numa sucessão de dias em que foram postos à prova todas as qualidades dos nossos soldados. Buscaccio, Montecavaloro, Lissano, II Sasso. Bombardeios mortais, insistentes, contra taques na calada das noites, patrulhas inúmeras marcam bem esse período. Apesar da nossa situação de inferioridade, dominados por alturas de todos os lados, resistimos e as posições foram mantidas. Mas, chegou o dia. Elevação 722, Soprassaso, Castelnuovo caíram. Mais um período estático em Ronchidos. Depois, começou a avançada que só terminou com a VITORIA. E os nomes continuam a perpassar: Mº Tortori, Monte Acuto, Monte Cepiniano, M. Guerro, Levizzano, Casanova, Colecchio, Gaianno e Voghera.
E o fim chegou. Repassando na mente de cada um, devem estar todos os companheiros que ficaram, marcando com as cruzes dos seus sacrifícios esta senda que nos conduziu à VITÓRIA. Agora, que de longe se sente os entes queridos acenando, com unção e saudade, não se pode deixar de pensar nos que se foram para que outros pudessem de novo ter a alegria de viver num mundo livre, novo e cheio de esperança. Quando de novo estivermos nos nossos lares, quando de novo pisarmos o solo pátrio, que os nossos pensamentos se voltem para todos aqueles nossos irmãos de armas que jazem em solo estranho e não tornem em vão os seus sacrifícios.
E o fim chegou. E este Comando leva o orgulho de ter comandado esta Cia, durante seus últimos quatro meses de campanha.
JOAO EVANGELISTA MENDES DA ROCHA
Capitão Comandante
Anexo 2
Capítulo do livro “Nacionalismo tem Sentido, Sim!”
Retorno ao meu Piauí, satisfeitos os anseios há muito tempo acalentados; chegar às margens do Rio Jenipapo, perto de Campo Maior, e conhecer a região da Lagoa do Jacaré no município de Piracuruca – ambos os locais ao Norte do Piauí. O primeiro, por sua referência histórica, dando seu nome à batalha que se travou a 13 de março de 1823, às suas margens, entre as tropas lusas de Fidié e os brasileiros piauienses e cearenses em grande maioria – sob o comando do Capitão Luiz Rodrigues Chaves. Última batalha pela total independência do Brasil, sua importância foi de tal monta que em sua honra se construiu o Monumento do Jenipapo para reverenciar os seus heróis, cerca de 600 que deram suas vidas e 80 feridos; e sobre quem o pesquisador e historiador piauiense Abdias Neves assim se expressou: “… e só a loucura patriótica explica a cegueira desses homens que partiam para o encontro com Fidié (Major João José da Cunha Fidié) quase desarmados”. E a respeito da verdadeira dimensão da Batalha, este pensamento de outro abalizado estudioso da história do Piauí: “Na Bahia, firmara-se a soberania do Brasil, e no Piauí, a unidade nacional.
Quanto aos aspectos táticos e estratégicos da operação Jenipapo, de 177 anos atrás, o armamento e as provisões de guerra, poucos dados possuímos para sua devida avaliação em termos de comando e organização. Num “estudo da situação”, relacionado com as operações militares do início do século passado, como a do Jenipapo, obviamente carentes de informações e comunicação, o único elemento de apreciação a nosso alcance, fora de quaisquer especulações e omissões, sem dúvida, é o local, a região, o terreno em que se feriram tais operações, combates ou escaramuças. No caso em foco da batalha do Jenipapo, à exceção do rio, que estava em cheia em princípio de julho, quando o visitamos, em vez de estar com o leito seco, no dia da operação, o terreno é como o descrito por Abdias Neves: “plano, apenas de longe uma colina quebra a monotonia da várzea aberta sem um amparo. Nas margens do rio, entretanto, tufam-se ribanceiras de mofundos e arbustos”.
O outro marco da independência do Piauí ficou conhecido como o Combate do Jacaré, a 10 quilômetros de Piracuruca, cuja região tive o privilégio de conhecer a 15 de julho último, ciceroneado pelo meu amigo Waldemar de Moraes Menezes, o conterrâneo dotado da melhor memória da cidade. Mais plana que Jenipapo; nesse local encontraram-se dois grupos armados; o dos independentes patriotas, assim chamados os brasileiros que lutavam por nossa independência, e o dos lusos subordinados a Fidié, quando já retornavam de Parnaíba para Oeiras. E assim consta da obra de Anísio Brito, historiador, piracuruquense e autor de vasta bibliografia: “Chegando aos Iliós de Baixo e desejando tomar a retaguarda dos independentes que haviam evacuado Piracuruca, mandou marchar oitenta homens de cavalaria com dois oficiais para reconhecer o terreno. No dia 10 de março (referindo-se ao ano de 1823), encontrou-se este piquete com uns quarenta ou cinquenta independentes também montados, com os quais tiveram uma escaramuça junto ao lago Jacaré, sofrendo estes últimos algumas perdas e ficando da tropa portuguesa um soldado prisioneiro” (da narrativa de autoria do Visconde Vieira da Silva). E comenta Anísio Brito: “Como se vê, Piracuruca foi onde primeiro se lutou pela nossa independência. A escaramuça à margem da lagoa do jacaré foi como que o prelúdio do grande combate do Jenipapo” (levando a efeito três dias após). E sobre o choque em lagoa do Jacaré, assim se referiu o não menos abalizado mestre e historiador Monsenhor Chaves. “Este chamado Combate do Jacaré tornou Fidié mais cauteloso naquele dia. Daí por diante sua marcha foi lenta, como que apalpando o terreno, temeroso de uma cilada, sempre pronto a tomar a defensiva ao menor sinal de ataque dos independentes.
Jacaré e Jenipapo – sem dúvida, as duas últimas heroicas resistências dos brasileiros ao jugo português.
Anexo 3
DIPLOMA DA CRUZ DE COMBATE
Criada pelo Decreto-lei nº 6.795, de 17 de agosto de 1944
O Presidente da República dos Estados Unidos do Brasil, resolveu, de acordo do o Decreto de 1 de novembro de 1945, conceder a Cruz de Combate de Segunda Classe ao Capitão de Arma de Infantaria, JOÃO EVANGELISTA MENDES DA ROCHA – Durante as operações ofensivas do 6º R.I., no decorrer dos dias 20 a 29 de abril de 1945, se destacou pela competência, bravura, destemor e espírito de sacrifício da perseguição ao inimigo através de ZOCCA LÁ TAGLIATA, GUIGLA, LEVIZZANO, MONTACHIO, VILA NOVA e CAPIGNANO, bem como na ação de sua Cia. destacada em cooperação com Tanks americanos, no qual resultou a queda de COLLECHIO, não medindo, para isso, sacrifício nem perigos para bem cumprir a missão que lhe fora confiada. Quando, em virtude da ação conjunta do nosso Regimento, a148ª D.I. Alemã e os remanescentes da Div. Itália a 90ª Alemã “PANZE” se renderam incondicionalmente, couve à sua Cia. a parte mais difícil e mais dura daquela vitória, mas, graças às suas excepcionais qualidades de Cmt., foi a mesma cercada de pleno êxito, nada ficando a desejar. O Cap. EVANGELISTA, demonstrou bravura, grande espírito ofensivo, destemor e desprendimento, atacando e ocupando o objetivo, mantendo-o até que o inimigo se rendesse incondicionalmente.
Rio de Janeiro, 1 de FEVEREIRO DE 1946
125º da Independência, 58º da República
Agradecimento:
Ao Prof. Dr. Marlos Bessa, filho do General João Evangelista Mendes da Rocha, pelo envio de informações e fotografias.
Fonte consultadas:
1 – Family Search. João Evangelista Mendes da Rocha. Link: https://www.familysearch.org/pt/tree/person/details/LBH2-ZZ4. Acesso em: agosto de 2025.
2 – História oral do Exército na Segunda Guerra Mundial. Coordenação geral de Aricildes de Moraes Motta. – Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército Editora, 2001. Páginas 105 a 113.
Os nossos heróis de guerra: em memória aos piracuruquenses que lutaram na 2ª Grande Guerra Mundial