Raizadas e pomadas milagrosas no Piauí

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O uso de plantas medicinais teve seu início provavelmente na pré-história. Os homens primitivos, assim como os animais, iniciaram as “práticas de saúde”, alimentando-se de determinadas plantas pelo instinto de sobrevivência. Com isso, poderiam ter observado determinados efeitos para minimizar suas enfermidades, acumulando conhecimentos empíricos que foram passados de geração para geração (www.farmaverde.com.br).

O acúmulo dessas informações pelos homens primitivos propiciou o surgimento de uma cultura da arte de curar e da farmacoterapêutica, que se tornou uma das bases importantes para o nascimento da medicina (id.).

Ao longo da História do Brasil, desde a época colonial até os dias de hoje  grande parte da população tem devotado uma fé incomensurável no poder criativo das plantas e em alguns casos, em produtos de origem animal. Numa época em que ainda não havia os modernos remédios, a única chance para a cura de incontáveis males era o conhecimento da capacidade curativa da natureza que os colonos tinham a sua disposição nas matas e rios.

Eram as raízes, folhas, sementes, frutos e cascas das árvores, conhecimento em parte herdado de nossos indígenas. Tanto na forma de chá, como de unguento, lambedor, tintura, inalativo ou de garrafada. Do outro lado, banha de galinha, banha do peixe boi, etc.

No Mercado Central ou Mercado Velho de Teresina existem alguns pontos e bancas que vendem incontáveis tipos de produtos medicinais de origem vegetal.

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BANCA DE PLANTAS MEDICINAIS NA ÁREA DO MERCADO VELHO DE TERESINA. FOTO: RAFAEL NOLETO 

A bem da verdade, hoje esta forma de cura e apelo popular vem perdendo paulatinamente espaço para a medicina alopática ou afins. Ainda assim, observa-se que um número significativo da população ainda faz uso das raizadas; seja por pobreza para adquirir medicamentos industrializados; seja por tradição na crença de sua eficácia, passada de pai a filho; seja pela ignorância, que faz da raizada um misto de medicamentoso com  crendice.

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MERCADO VELHO DE TERESINA. A TRADICIONAL CASA DAS “EVAS” (ERVAS).

O gengibre “seca” a barriga e faz emagrecer rapidamente; casca ou folha de Pata de Vaca (mororó) para diabetes; casca de ameixa do mato, para cicatrizante, regulador intestinal e tônico renal; babosa para hemorroida; capim santo para cólicas uterinas e intestinais e nervosismo; urucum, para asma, bronquite e colesterol; casca de aroeira para ferimentos, infecções, úlceras, hemorroidas, etc;  quebra pedra para eliminar cálculos renais; mastruz como anti-inflamatório e cicatrizante; erva cidreira, como analgésico e antidepressivo; folhas ou cascas de aroeira para inflamação; folhas de boldo para problemas estomacais; raiz de batata de purga como laxante e vermífugo; folha de orelha de onça, para asma; casca de umburana de cheiro, para pressão alta; etc…etc… 

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MERCADO CENTRAL DE TERESINA. GENGIBRE PARA EMAGRECER.

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MERCADO CENTRAL DE TERESINA. CASCA DE AMEIXA DO MATO PARA INTESTINO E RINS.

O grande ´problema para esta medicina popular é que a maioria das mezinhas não tem eficácia  comprovada cientificamente, além do que as plantas e ervas, mesmo sendo medicamentos naturais, podem intoxicar gravemente, cegar, provocar coma e até matar. Muitas são muito agressivas ao sistema hepático. Dentre as contraindicações mais comuns, provocam aborto, diarreia, desordens cardíacas, reações alérgicas, doenças hepáticas, erupções cutâneas, etc. Portanto, é um imenso absurdo achar que produtos naturais como raízes, folhas, cascas e frutos são inofensivos.

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MERCADO CENTRAL DE TERESINA: SEMENTES, FOLHAS, CASCAS, RAÍZES E FRUTOS PARA TODOS OS TIPOS DE PROBLEMAS. FOTO: RAFAEL NOLÊTO.

Outra forma de medicamentos “naturais” já é uma tradição antiga da Amazônia e do Nordeste. Sua venda é feita em banquinhas ou veículos, na forma de latinhas artesanais com pomadas que curam vários males, notadamente inchaços, entorses, hemorroidas, reumatismo, artrite, inflamações, problemas urinários, micose, chulé, etc. 

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BANQUINHA MÓVEL DE PRODUTOS MIRACULOSOS, POMADAS E UNGUENTOS. CENTRO COMERCIAL DE PIRIPIRI-PI.

Banha do Peixe-Boi, Banha do Peixe Elétrico, Cartilagem de Tubarão, Micozol, Castanha Atalaia, Óleo de Madeira Jerimatálha, banha de Baiacu, Creme Sapucaína, Creme Limpa Pele, etc. Pomadas para todos os tipos de doenças. 

Seus vendedores são falastrões e convincentes, sempre voltados em sua atenção para a população de baixa renda. Ocupam lugares estratégicos, geralmente não fixos, e instalam bancas rapidamente desmontáveis ou vendem seus produtos na traseira dos automóveis. Trata-se de uma espécie de comercio itinerante, ao contrário daquele das raizadas, que é sedentário.

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VENDEDOR EXPLICA A EFICÁCIA DOS PRODUTOS A UMA EVENTUAL COMPRADORA.

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UNIDADE MÓVEL DE VENDA DE POMADAS, CREMES E UNGUENTOS MIRACULOSOS. ÁREA DO MERCADO PÚBLICO DE PIRIPIRI-PI.

Duas destas latinhas nos chamaram a atenção.  A primeira é a cartilagem de tubarão, que também é vendida em cápsulas nas farmácias e até pela internet, pois teria a capacidade de impedir a progressão de tumores, doenças degenerativas, doenças reumáticas, afecções oftálmicas, etc. Nada comprovado. Aliás, estudos parecem comprovar não as qualidades curativas, mas que a cartilagem poderia aumentar a possibilidade de risco de Mal de Alzheimer e outras doenças degenerativas. Interessante é o rótulo da pomada de cartilagem de tubarão. É para rir. Está escrito: 

Causilagem (cartilagem) do Tubarão. Torsicolo (torcicolo), ematomas (hematomas), dor de dente, sinusite, coluna inchação, bucite (bursite), dor de cabeça, etc. 

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CAUSILAGEM DO TUBARÃO.

Em segundo lugar, a Banha do Peixe Boi, também vendida pela Internet, é outro sustentáculo desta atividade. Como se sabe, o Peixe-Boi é um animal em extinção na Amazônia, sendo sua pesca proibida desde 1969. È apregoada como miraculosa para ferimentos, infecções, reumatismo, etc. Mas se vocês pensam que os fabricantes da pasta e os vendedores estão incorrendo em crime ambiental, estão enganados. Vender vaselina não é crime. Um projeto da UNISANTA em parceria com o IBAMA analisou a suposta banha das latinhas, comprovando que se tratava de vaselina… Melhor para o Peixe-Boi. A natureza agradece a falcatrua… 

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BANHA DO PEIXE BOI “LEGÍTIMA” VENDIDA PELA INTERNET. REPRODUÇÃO.

Assim, o envasamento e venda deste tipo de ‘medicamento natural” é lesivo ao consumidor, geralmente de pessoas pouco esclarecidas,  ´pois vende “gato por lebre”…

Em tempo, para cura do chulé tem a pomada Micozol… Cura com estas pomadas só mesmo na base do placebo.

Em suma, trata-se de uma propaganda extremamente desonesta e abusiva, ao contrário do comercio das raizadas, que segue uma tradição popular centenária.