Retratos de um passeio por Teresina e por Altos em 2010: o shopping da cidade, os índios, a música e os lobos

Na manhã deste sábado, fui às compras, com minha mulher e minha filha, no centro da cidade. Enquanto a Fátima se desincumbia da demorada tarefa, por sua sugestão, fui com a Elmara conhecer o chamado shopping da cidade, onde foram instalados os camelôs que tomavam as ruas, as praças e as calçadas do centro histórico e comercial de Teresina. Devo admitir que foi um grande feito a atual gestão municipal conseguir a solução desse problema, de forma adequada e confortável para os vendedores ambulantes e para as demais pessoas, pedestres, motoristas e clientes.

Minha filha aproveitou o ensejo para tirar fotografias dos pombos que ainda existem na Praça Marechal Deodoro da Fonseca, em suas acrobacias e revoadas. Vendo as aves em suas casinholas, lembrei-me do poeta Raimundo Correia, que também foi juiz de Direito. Num de seus magistrais sonetos, o parnasiano disse que, na juventude, semelhante às pombas que deixam os pombais, as ilusões nos acompanham em revoada. Só que com esta diferença: as pombas retornam ao seu ninho, mas as ilusões, em nossa velhice, não voltam mais. O vate terminou ganhando o incômodo epíteto de poeta das pombas. Evidentemente, ele detestava tal apelido, e não lhe via a menor graça.

Na praça, perto da estátua do poeta repentista Domingos Fonseca, no gênero um dos maiores do Brasil, se apresentava o Grupo Purik, composto por índios, que se autodenominam “caminantes de los Andes”. Provavelmente, são descendentes dos Incas, que construíram as notáveis pirâmides andinas e formaram avançada e antiga civilização, tanto na agricultura, que era irrigada, como na domesticação de lhamas, alpacas e porquinhos-da-índia, bem assim na construção de prédios, monumentos, aquedutos e estradas, até a sua destruição pelo contágio de doenças europeias e pelas tropas de Francisco Pizarro, que foi o El Matador de lá. Não sei se houve algum H. Dobal andino a vergastar a sanha do conquistador espanhol.

O grupo musical era formado por homens e mulheres, que vestiam suas roupas típicas e tocavam instrumentos de sopro e percussão, com o auxílio mecânico de playback. Havia uma bandeja para o recolhimento de contribuição financeira dos ouvintes e eram vendidos cd e dvd. Na capa do dvd que adquiri, estavam estampadas uma matilha de lobos e a imponente cordilheira dos Andes, sobrevoada pelos condores de Castro Alves, justamente considerado o maior poeta condoreiro do Brasil. Ao ouvir a bela e pitoresca música, com o som de diferentes flautas de Pã, pífanos, maracás e tambores, fui tomado por forte emoção, talvez atávica, como se um chamado selvagem e harmonioso me atraísse para as eternas geleiras andinas. Cheguei a sentir um quase calafrio, como se, por entre os sons das flautas e dos tambores, eu ouvisse o uivo enregelante de um lobo a me espreitar na neve.

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Estive à noite na cidade de Altos, também conhecida como “capital da manga”, mas não degustei nenhuma dessas suculentas frutas, até porque não está no tempo de sua safra. Fui à festa de aniversário de meu colega e amigo Zé Olindo, que também foi amigo de meu saudoso cunhado Zé Henrique, falecido precocemente, vítima de acidente de motocicleta na saída de Altos para Campo Maior, um quilômetro depois da ferrovia. Foi, como se dizia nos tempos da jovem guarda, uma festa de arromba, com música ao vivo, e farto e variado cardápio de iguarias e bebidas.

Entre os artistas, estava presente Édel Reis, o famoso Rei do Brega, de muito talento em seu gênero musical, com suas músicas do tipo “dor de cotovelo”, com letras contundentes, para romântico nenhum botar defeito. Entre outros colegas juízes, estavam presentes Carlos Hamilton, Edson Rogério, Sebastião Firmino, Raimundo José Gomes e Reinaldo Magalhães.

Conversei com o advogado Antônio Carlos Costa e Silva sobre coisas de José de Freitas, inclusive do tempo em que ali morei, durante um ano, no meu início de adolescência, quando, com o apoio do padre Deusdete Craveiro de Melo e outros meninos, fundei um time, o Santos, e um campo de futebol, na frente do cemitério velho, mais conhecido pelo povo, talvez com certa dose de ironia, como cemitério dos ricos, em virtude das pessoas que lá estão enterradas e também por causa dos ricos e suntuosos mausoléus.

Lembrou o causídico que recebi o título de cidadania daquela bela e bucólica cidade. Disse-lhe que postei na internet um pequeno vídeo sobre essa cidade. Também conversei com o pai do Zé Olindo, o legendário advogado José Gil Barbosa, prefeito de Altos em três mandatos e ex-deputado estadual, em pleno vigor, na juventude de seus noventa e dois anos. Foi uma noite agradabilíssima, pela música, pelas iguarias, pela libação e pela conversa com os colegas, recheada de casos anedóticos e piadas. Vida longa, pois, ao amigo e colega Zé Olindo.