O palacete de Tertuliano Filho em Pedro II

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Poucas são as edificações no estilo palacete, com marcantes características neoclássicas, preservadas integralmente na arquitetura piauiense. Um exemplar notável está na histórica e turística cidade de Pedro II, norte do Piauí. 

Trata-se da antiga residência do político pedrossegundense Tertuliano Brandão Filho (1864-1932), localizada na Praça da Independência, precisamente na confluência das ruas Tertuliano Filho (fachada principal) com João Benício da Silva (fachada secundária) Talvez a mais imponente desta serrana Cidade, de riquíssimo patrimônio arquitetônico preservado.

Bem material tombado como Patrimônio Público Estadual pela FUNDAC – Fundação Cultural do Piauí, através do Decreto: Nº 8.686 de 06/07/92, hoje a construção é denominada Memorial Tertuliano Brandão Filho.

O diferencial entre o Memorial e muitas outras edificações tombadas no Piauí é que a preservação desta de Pedro II se dá tanto na fachada como na estrutura interna.

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O IMPONENTE E ELEGANTE MEMORIAL DE PEDRO II CHAMA A ATENÇÃO DO VISITANTE.

O político

Tertuliano Brandão Filho (1864-1932) era filho Tertuliano Pereira Brandão (? – 1916) e Maria Mendes Brandão (? – ?). Foi casado como com Joana Cardoso Brandão (? – ?). De seu casamento, realizado na Fazenda Invejada, em Alto Longá, tiveram os seguintes filhos: Maria Marfhisa e Walter (falecidos ainda crianças) Tertuliano Milton Brandão, Tertuliano Sólon Brandão, Maria Consuelo Brandão e Raimundo Nonato Brandão (fonte:Pedro II Turma A).

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QUADRO COM A IMAGEM DO PODEROSO POLÍTICO E COMERCIANTE TERTULIANO FILHO. ACERVO DO MEMORIAL.

Tertuliano foi comerciante, criador e agricultor, coronel da Guarda Nacional, chefe político do município de Pedro II, Intendente Municipal e Deputado Estadual em 06 legislaturas. Seu ultimo mandato foi interrompido com a Revolução de 1930. Como comerciante dos mais destacados desta região do Estado, criador e proprietário de numerosas fazendas deu grande prestigio e incentivo à economia regional (Fonte: Pedro II Turma A).

 A construção do palacete

A primorosa edificação de 485 m² teve sua construção iniciada em 1922 tendo sido concluída em 1925, conforme está registrado em algarismo romano no frontão hemisférico do Palacete, voltado para a Praça da Independência.

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 O FORMOSO PALACETE DE TERTULIANO FILHO.

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FRONTÃO CURVO OU HEMISFÉRICO DO PALACETE COM A DATA DA INAUGURAÇÃO (1)925, CERCADO POR DOIS BELÍSSIMOS PINÁCULOS.

Conforme Sara Mourão Benício (1986, apud Melo & Almeida, 2007) sua edificação contou com os artesãos e mestres-de-obras cearenses Luís Nunes e João Umbelino, vindos de Sobral e Ipu, os maiores centros de comércio do Ceará na época.

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ESTA IMAGEM SERIA DO ANO DA INAUGURAÇÃO, SEGUNDO COLEÇÃO ITAMARATY (1987, APUD MELO & ALMEIDA, 2007).

O local sempre foi palco de importantes acontecimentos, decisões sociais e políticas do Estado, pois era a residência de uma das mais importantes famílias do Piauí (Fonte: Pedro II Turma A).

Durante a 1° Republica logo que a casa foi construída passou por Pedro II a Colônia Prestes. E o belo palacete do Coronel Terto, político de renome e alto comerciante, foi saqueada e terrivelmente danificada num ato de rebeldia intensa e insana. As tábuas da sala de jantar que compunham o seu piso foram arrancadas, para que de lá se retirassem dobrões de ouro patacões de prata e joias, resguardadas por seus donos quando se teve notícias dos atos de vandalismo praticados noutros sítios pelas tropas rebeldes. Estas tábuas arrancadas serviram de lenha para assar bois charqueados na Praça da Independência e assados em enormes fogueiras e braseiros lá e dentro de casa na sala principal (id.).

O memorial é criado

O proeminente coronel Tertuliano Filho faleceu em 1932 e o palacete passou a pertencer a seu filho mais velho, Tertuliano Milton Brandão (1916-1985), deputado estadual (1947-1951), vice-governador e presidente da Assembleia (1951-1955) e, como deputado federal,  teve sete mandatos. Milton Brandão teve cinco irmãos, sendo Tertuliano Solon Brandão (falecido em 1983), ex-prefeito de Pedro II o mais conhecido deles.

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MILTOM BRANDÃO HERDOU O PALACETE DE SEU PAI. FONTE: JORNAL DA MANHÃ, TERESINA 02 DE JUNHO DE 1985.

Solteiro, Milton Brandão manifestou, através de instrumento público de testamento, o desejo de que a casa fosse utilizada como o Memorial, abrigando o Centro Cultural de Pedro II e recebendo o nome de seu pai.  Assim foi feito, sendo o imóvel tombado por Decreto Estadual e cumprida a vontade do filho do coronel Tertuliano.

O Memorial foi inaugurado em 10 de março de 1987, pelo então governador do Piauí, José Raimundo Bona Medeiros (n. 1930), e contou com o trabalho da arquiteta Alcília Afonso e do artista plástico Nonato Oliveira, que executou a montagem do local.

Segundo Melo & Almeida (2007) o acervo é composto por 800 peças, sala da família, sala em memória do deputado Tertuliano, biblioteca com 988 volumes, auditório com 50 lugares, lojas de artesanato; fica aberto ao público de segunda à sexta-feira, e aos sábados pela manhã. Recentemente, o Memorial passou, mais uma vez, por outro processo de restauração, concluído em duas etapas: a primeira, em maio de 2005,com recursos do governo do Estado; e a segunda, em junho de 2006, através da Fundação Cultural do Piauí (FUNDAC), que obteve recursos do Mistério da Cultura e do Fundo Nacional de Cultura (FNC), para concluir a recuperação de uma das mais importantes edificações históricas de Pedro II e do Piauí. Tal reforma impediu o processo de degradação e arruinamento que o edifício vinha sofrendo ao longo do tempo (FUNDAC, 2005).

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IMAGEM DO PALACETE EM ÉPOCA NÃO ESPECIFICADA, MAS COM CERTEZA ANTES DAS REFORMAS ACIMA DESCRITAS. FONTE: FUNDAC.

Podemos acrescentar a esta uma última reforma, efetuada há pouco mais de um ano, quando estivemos por lá.

Características arquitetônicas externas

Com telhado de duas águas, não há perfeita simetria de fachada no velho casarão que, porém, conserva claras linhas neoclássicos.  Há uma platibanda, parcialmente vazada; cornijas; porão alto com óculos; predomínio de janelas em pares; frontão decorado; janelas com guarda corpo balaustrado na fachada principal; janelas com guarda corpo de gradis de ferro na fachada lateral; pináculos, cercadura em massa e bandeiras nas portas e janelas; cunhais; estuques nas paredes internas e externas; imensos arcos plenos no interior,  etc.

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IMAGEM ORBITAL MOSTRANDO A SITUAÇÃO LOCACIONAL DO PALACETE E LOGRADOUROS VIZINHOS.

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IMAGEM DA FACHADA PRINCIPAL DO CASARÃO. OBSERVEM A CORREÇÃO TOPOGRÁFICA MARCADA PELAS SETAS VERMELHAS PARA DEIXAR A CASA PLANA, FEITA DURANTE A CONSTRUÇÃO, POIS O TERRENO DA MARGEM ESQUERDA É MAIS ELEVADO DO QUE O DA MARGEM DIREITA.

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VISTA DAS DUAS FACHADAS DO PALACETE. EM DESTAQUE O CUNHAL (1), MARCADO COM A SETA. OBSERVEM QUE A FACHADA PRINCIPAL, VOLTADA PARA A PRAÇA APRESENTA JANELAS RASGADAS COM GUARDA CORPO DE BALAÚSTRES ENQUANTO QUE A FACHADA SECUNDÁRIA APRESENTAM ESTES GUARDA CORPOS EM GRADIS DE FERRO. OUTROS ELEMENTOS DE DESTAQUE SÃO O PINÁCULO (2), A PLATIBANDA VAZADA, TIPO RENDILHADO (3) E O FRONTÃO (4).

Por toda a extensão das fachadas, abaixo, de cada janela rasgada há um óculo de metal fendilhado, destinado a deixar adentrar luz e/ou ventilação ao porão alto. 

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DETALHE DE UM ÓCULO OITAVADO DO PORÃO ALTO DA EDIFICAÇÃO.

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FACHADA SECUNDÁRIA. OBSERVEM QUE PARA CADA JANELA RASGADA COM GRADIL DE FERRO CORRESPONDE UM ÓCULO SUBJACENTE DO PORÃO ALTO, ASSIM COMO NA FACHADA PRINCIPAL. O ÓCULO É UMA ABERTURA DO PORÃO ALTO, CIRCULAR OU NÃO, DESTINADA A ENTRADA DE AR/LUZ NO PORÃO ALTO.

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JANELAS GEMINADAS QUE POSSUEM QUATRO FOLHAS DE PERSIANAS, BANDEIRA DE VIDRO E GUARDA CORPO VEDADO COM BALAÚSTRES. COM CERCADURA EM MASSA EM TORNO DELAS, NO ALTO UM FRONTÃO COM AS INÍCIAIS DO CORONEL: TBF. OBSERVEM A  GRACIOSIDADE DO ESTUQUE TIPO VENEZIANO EM COR LARANJA. NÃO SABEMOS SE ORIGINALMENTE ERA ASSIM.

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DETALHE DA BELÍSSIMA PLATIBANDA VAZADA Á MANEIRA DE RENDILHADO GEOMÉTRICO, LADEADO POR DOIS PINÁCULOS.

Conteúdo e arquitetura interna

Para os padrões piauienses o interior do palacete oferecia espaço, solidez e conforto aos seus moradores. Salas e quartos amplos e imponentes, bem decorados e com alguns arcos imensos compunham a estética interna.

O acesso pela porta frontal se faz através de escada com degraus em tábua corrida e balaustrada lateral. Esta entrada (antecâmara) dá acesso à sala de visitas n° 1, ao quarto de dormir do casal e ao hall interno. O acesso se faz através de belíssimo portão que vale a pena ser observado. Todo ele é trabalhado a mão, em desenhos florais com pássaros acasalados. Na parte superior, quando fechadas às duas folhas da porta pode ser lido o nome do senhor da casa: Terto Filho (Fonte: Pedro II Turma A).

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BELÍSSIMA OBRA DE ARTE ESTA PORTA EM ARCO PLENO COM FEIÇÕES SIMÉTRICAS NO HALL DE ENTRADA DO EDIFÍCIO. CAPRICHOSA E ORIGINAL FOI CONFECCIONADA COM ESMERO. A IMAGEM NÃO MOSTRA CLARAMENTE, MAS ONDE AS SETAS ASSINALAM, NAS DUAS FOLHAS DA PORTA, ESTÁ ESCULPIDO NA MADEIRA: TERTO FILHO.

Sobre a sala principal, onde estão os quadros e alguns objetos familiares, há depoimentos sobre mobiliário austríaco lá existente: confortáveis e belas cadeiras “thonet” de embalo desenhadas em volutas de madeira vergada. Consolettes de ferro batido usados para colocar “cache-pots” ou lampiões, ladeavam uma mesa – console maior onde se colocavam lampiões e caixas de charutos. Este parecia ser o lugar onde se ouvia música, onde se fazia a leitura, onde se começava e acabava o ritual das refeições. Era um local destinado à espera, a meditação conversa descontraída, e ao lazer como ocorria nas antigas casas senhoriais. As portas se abrem harmoniosamente em pares para a sala de jantar e para o jardim (Fonte: Pedro II Turma A).

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DETALHE DE UMA DAS PORTAS DE UM DOS SALÕES, APRESENTANDO BANDEIRA VAZADA EM MADEIRA RICAMENTE PRODUZIDA COM ORNATO VEGETALISTA. NA PAREDE O BELO EFEITO DE COR DO ESTUQUE.

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FORRO COM TÁBUAS CORRIDAS. AS LUMINÁRIAS DEVEM SER UM POUCO POSTERIOR A CONSTRUÇÃO, POIS EM 1925 AINDA NÃO HAVIA USINA DE ELETRICIDADE A DIESEL/LENHA NA CIDADE. 

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ACERVO DE MEDALHAS E CONDECORAÇÕES CONCEDIDAS AO POLÍTICO TERTULIANO MILTON BRANDÃO, O FILHO DO CONSTRUTOR DA CASA.

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QUADRO COM A IMAGEM DE TERTULIANO PEREIRA BRANDÃO (?-1916), PAI DE TERTULIANO FILHO.

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QUADROS E DOCUMENTOS DA FAMÍLIA BRANDÃO. OBSERVEM O ASSOALHO DE TÁBUA CORRIDA.

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ESTE É O MAIOR COMPARTIMENTO DA CASA, POSSIVELMENTE A ANTIGA SALA DE JANTAR. OBSERVEM O IMENSO ARCO PLENO.

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ALPENDRE NA PARTE ANTERIOR DO PALACETE.

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ARCO VOLTADO PARA O ALPENDRE INTERNO.

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VELHO FOGÃO A LENHA NO ANEXO DO PÁTIO.

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PÁTIO DA PROPRIEDADE. ABAIXO DAS DUAS JANELAS CENTRAIS SE OBSERVA DUAS ENTRADAS PARA O PORÃO BAIXO.

No porão alto a altura não é muito cômoda. Na época da escravidão estes porões eram destinados aos escravos. Como a construção foi feita muito depois da Abolição, neste caso serviriam para guardar mercadorias ou mantimento e ocasionalmente abrigar os empregados. A iluminação diurna e a entrada de ar se faziam pelas portas de entrada e pelos óculos, aquelas aberturas circulares que rodeiam as faces do porão alto.

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DETALHE DE UMA DAS ENTRADAS DO PORÃO. AO LADO, UM ÓCULO.

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PORÃO ALTO DO PALACETE VOLTADO PARA A PRAÇA DA INDEPENDÊNCIA. SEU TETO, QUE ALICERÇA A EDIFICAÇÃO, É FORMADO POR VOLUMOSOS TRONCOS DE MADEIRA. 

Fontes:

Coutinho, Reinaldo. Arquivo pessoal.

FUNDAC. Fundação Cultural do Piauí. Bens tombados e registrados do Piauí. Coordenação de Registro e Conservação. Teresina, junho de 2012.

Melo, N. & Almeida, M.do C. Memorial Tertuliano Brandão Filho: história e arquitetura. XII encontro da Associação Nacional de Pós-graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano e Regional, de 21 a 25 de maio de 2007 Belém – PA.

Pedro II Turma A. Bibliografia de Tertuliano Brandão Filho in http://pedroii.blogspot.com.br/2012/06/cultur.html