Antigo concurso sobre a melhor Rua de Teresina

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O jornal teresinense Cidade Verde foi um semanário literário de efêmera duração, pertencente ao intelectual, autodidata, poeta e jornalista nascido no município de Monsenhor Gil (antigamente Natal) Raimundo Zito Batista (1887-1926). Irmão do teatrólogo e jornalista Jônatas Batista (1885-1935) e neto do jornalista David Moreira Caldas (1836- 1879), cognominado o Profeta da República, também pertenceu a Academia Piauiense de Letras. Seu jornal circulou em Teresina apenas no ano de 1912.

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TÍTULO DO JORNAL DE ZITO BATISTA, QUE CIRCULOU APENAS EM 1912.

O jornal Cidade Verde realizou em 1912 um curioso concurso intitulado Nossas Ruas que era uma maneira de conhecer qual a rua (ou também Bairro, praça e Avenida) que mais despertava o entusiasmo e a admiração do teresinense.

Sempre utilizando uma linguagem literária fina, o jornal procurou despertar no teresinense um sentimento ufanista de sua terra natal. 

Utilizando cédulas de votação, distribuídas e controladas por gentilíssimas senhoritas o concurso mostrou o amor do teresinense ao seu torrão natal. A apuração criteriosa, realizada na residência de Jônatas Batista, que também colaborava com om jornal do irmão, apresentou os  seguinte resultado:

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RESULTADO DA APURAÇÃO DA PESQUISA AS NOSSAS RUAS, REALIZADO EM FEVEREIRO DE 1912. FONTE: JORNAL CIDADE VERDE, TERESINA 29 DE FEVEREIRO DE 1912.

Em primeiro lugar, com 1.956 votos, a Avenida Frei Serafim, então repleta de quintas e chácaras. Mas já se antevia a importante artéria que iria se tornar na nossa Capital. A denominação original era a atual. Mudou durante o período Vargas (1930-1945) para homenagear o político, voltando depois a Frei Serafim.

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IMAGEM DA CHÁCARA LAVINÓPOLIS, INÍCIO DO SÉCULO XX, POSSIVELMENTE DA ÉPOCA DO CONCURSO DO JORNAL. LOCALIZAVA-SE NO TERRENO DO ATUAL POSTO MERCURY, AO LADO DOS FUNDOS DA IGREJA SÃO BENEDITO. FONTE: BRIQUET DE LEMOS E POSTADA POR LALINHA ANDRADE, NO SITE TERESINA MEU AMOR.

Parece que nesta época a avenida tinha um charme bucólico e cobiçador, caindo posteriormente em decadência no período pré-urbanização, para volver a se tornar uma das mais importantes da Capital durante o período Vargas (1930-1945). Isso porque décadas após o concurso, em 15 de abril de 1943, o articulista Filoceno Gomes publicou no jornal teresinense GAZETA (Teresina, 15 de abril de 1943), que estivera naquela artéria há alguns anos e descrevia como lamentavelmente comovedor seu estado de conservação. Acrescentava o jornalista que, à exceção do Colégio das Irmãs sempre interminável e de um casarão da família Ferraz o que havia em termos de residências era lastimável. 

Além algumas modestas residências particulares, tristes, de aspecto fúnebre, e a distância acentuada uma das outras. Quase nenhum era o seu movimento, por isto que os vários quarteirões de sua parte principal, a largura de dezenas e dezenas de metros, o mato e o lamaçal que aí reinavam tudo lhe emprestava uma aparência de uma estrada inacabável.

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POSSIVELMENTE NA PRIMEIRA VISITA DE FILOCENO GOMES AO COLÉGIO DAS IRMÃS ERA ESTA A APARÊNCIA DA INSTITUIÇÃO.

Sobre a iluminação de sua visita anterior, Gomes revela ser deplorável, com poucos postes. 

Agora, em abril de 1943, agora com o nome de Av. Getúlio Vargas, o jornalista voltou ao local e teve outra impressão totalmente diferente.

Que encantadora via pública.

Dividida em duas alas, uma já toda calçada e a outra em via de conclusão, dispõe de farta iluminação elétrica, rede telefônica e arborização metódica no eixo e passeios laterais.

Nota-se ao centro o busto em bronze do chefe da Nação. Ao longe, ergue-se o suntuoso Hospital Getúlio Vargas, empreendimento de extraordinário alcance social e que, por si só, mui bem traduz a operosidade e eficiência da atual administração estadual. O antigo Colégio das Irmãs muito outro se nos apresenta: de feição toda nova e empolgante. Sugestivo e de significação relevante, encontramos o convento São Benedito. Residências particulares inúmeras se desfraldam à nossa vista, as mais luxuosas e atraentes.

De velha e indesejável que era, transformada está aquela avenida moça, formosa risonha e cheia de vigor, por todos adorada e estimada. Pequenina, perfumada e irrequieta se tornou. É hoje o ponto residencial predileto. É o primor de Teresina.

Como se observa, com a redução substancial de quintas e chácaras, as residências particulares de arquitetura mais arrojada com seus palacetes, bangalôs e chalés, tomaram conta da artéria, causando a simpatia de Filoceno Gomes.

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A ENTÃO AVENIDA GETÚLIO VARGAS, VISTA PELO JORNALISTA FILOCENO GOMES. IMAGEM DE AUTORIA DESCONHECIDA.

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PALACETE DO INTERVENTOR VARGUISTA LEÔNIDAS MELO EM 1945. FONTE: ACERVO FOTOGRÁFICO DE MARIA DO SOCORRO MELO TAJRA.

Voltando ao concurso de 1.912 vencido pela Avenida Frei Serafim, o segundo classificado, com 1.944 votos, apenas 12 a menos que a artéria vencedora, foi a Rua Paissandu, um dos berços centrais da história teresinense, com muitas residências, palacetes e acima de tudo, lojas, armazéns, clínicas, etc. Anteriormente se chamava Rua do Pequizeiro.

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MUITOS PONTOS COMERCIAIS E RESIDENCIAIS, BOM CALÇAMENTO E ARBORIZAÇÃO CARACTERIZAVAM A RUA PAISSANDU.

Em terceiro lugar a Rua da Glória, com seus 1.866 votos. É a atual Rua Lisandro Nogueira, também um foco de pontos residências e comerciais da época.  

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IMAGEM POSSIVELMENTE DA ANTIGA RUA DA GLÓRIA, HOJE LISANDRO NOGUEIRA. AUTORIA DESCONHECIDA.

Em quarto lugar do gosto dos teresinenses, com 1.525 votos, a Rua Bella, atual Senador Teodoro Pacheco, sem dúvida a mais comercial de nossas antigas artérias naqueles tempos.

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FOTO MUITO ANTIGA E COLORIZADA DA RUA BELA. AUTORIA DECONHECIDA.

Estas quatro artérias urbanas tiveram a esmagadora maioria dos votos. A partir do quarto lugar, ganho pela Rua Bella, as outras sete artérias juntas não alcançaram sequer 10% de votos atribuídos à quarta colocada.

Foram elas: 

5º – Com 75 votos, o Bairro do Barrocão, equivalente a um trecho da atual A. José dos Santos e Silva;

6º – Com 58 votos, a Rua Grande, hoje Rua Álvaro Mendes;

7º – Com 09 votos, Rua são José, atual Rua Félix Pacheco;

8º – Com 03 votos, Praça Uruguaiana, hoje Praça Marechal Deodoro, onde começou a instalação da capital Teresina em 1852, com prédios administrativos, mercado, sobrados, etc.

9º Com 02 votos, Campo de Marte, hoje Praça João Gayoso, onde se localiza o Ginásio Verdão e o Estádio Municipal Lindolfo Monteiro;

10º e 11º, Com apenas um voto cada, ruas David Caldas e Coelho Rodrigues, que preservam ainda estas denominações.

A comissão apuradora dos votos reuniu-se regularmente na casa de Jônatas Batista, procedendo rigorosamente a apuração, que ocorreu fiscalizada e discutida, com representantes das diversas ruas. Segundo os organizadores, tudo se passou de maneira regular, salvo um ou outro contratempo contornável.

Como seria hoje uma votação deste tipo? Entusiasmaria a população? Algumas destas ruas manteriam sua performance? Ou teríamos resultados diferentes em função não só da urbanização acelerada, que transfigurou aquelas artérias, mas também por causa da mudança de mentalidade da população atual em relação aos antigos?