O misterioso terremoto de 1808 no Piauí

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Os tremores de terra violentos além de erupções vulcânicas ocorrem nas bordas das Placas Tectônicas quando elas se chocam (ex: Placa região Andina), onde elas se afastam (ex: Cordilheira submersa Meso-Atlântica) e quando resvalam entre si (ex: o que acontece na Califórnia.). Os países que se inserem nas bordas destas placas tem tremores avassaladores, tais como Chile, Equador, México, Japão, Portugal,  Irã, Haiti, Indonésia, Califórnia (EUA), etc.

Os que se se inserem distante das zonas de atrito, ou seja, distante do encontro ou afastamento de duas placas não sofrem tremores diretos, mas sim reflexos dos tremores das bordas das placas. É o caso do Brasil, a maior parte dos EUA, Austrália, Uruguai, etc.

São reconhecidas 52 placas tectônicas, 14 principais e 38 menores.

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PRINCIPAIS PLACAS TECTÔNICAS. O BRASIL SE INSERE NO CENTRO DE UMA: A SUL AMERICANA. FONTE: WIKIPÉDIA. 

Embora não exista mais vulcanismo ativo no Brasil nosso território não está livre de tremores de terra em decorrência de falhas geológicas e outros fenômenos.  Vale salientar que os tremores não são causados apenas pela natureza. Há os de origem humana, que podem ser causados, por exemplo, pela construção de barragens. Mas nada nunca de intensidade igual ao que se vê nos países situados nas bordas das placas.

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FALHAS GEOLÓGICAS PROFUNDAS OU ZONAS DE FRAQUEZA NA PROVÍNCIA BORBOREMA (NORDESTE ORIENTAL). AS SETAS VERMELHAS REPRESENTAM OS ESFORÇOS COMPRESSIVOS ORIGINADOS NAS BORDAS DA PLACA SUL-AMERICANA.FONTE:  http://www.comciencia.br/comciencia/?section=8&edicao=55&id=694

Aqui no Brasil os campeões de tremores são o Ceará e o Rio grande do Norte. O Ceará possui duas falhas geológicas ativas, que o colocam dentro da região de maior sismicidade do País, junto com o Rio Grande do Norte. Aqui as duas rachaduras na placa tectônica não têm ligação uma com a outra: uma passa pela Região Norte e outra pelo Vale do Jaguaribe, estendendo-se até o litoral.

 As duas áreas também são as mais ativas no Nordeste. Também o Acre sofre muito com os tremores. Além deles, São Paulo, Pernambuco, Mato Grosso, etc. 

O tremor de maior magnitude já registrado na região foi no município cearense de Cascavel, em 1980, com 5,2 graus na escala Richter. Ficou conhecido como “Terremoto de Pacajus” (outro município cearense). Este, aliás, sentimos seus reflexos quando morávamos em Fortaleza nesta época. Poucos segundos, mas um tremor uniforme: não escapa nada. Paredes, móveis vibram uma sensação indescritível. Outros registros apontam como o maior terremoto em solo brasileiro o de 1955 em Mato Grosso, que atingiu 6.2 pontos na escala Richter.

João Câmara, município do Rio Grande do Norte convive sempre com estes tremores, provavelmente reflexos de instabilidade na Dorsal Meso-Atlântica, cordilheira submersa no oceano.

Outros fatores geológicos também podem levar a pequenos tremores, como acomodação de camadas rochosas, dissolução e desabamento de cavernas calcárias, etc.

No Piauí são raríssimos os tremores, mas ocorrem.  O Observatório de Sismologia de Sobral, no Ceará, confirmou o abalo sísmico de 17 de fevereiro de 2008 em nove cidades do Piauí de 3,5 graus na escala Richter, uma intensidade considerada baixa, segundo o geólogo Paulo Lages, da Secretaria Estadual do Meio Ambiente.  O terremoto por volta de 0h10 da madrugada ocorreu em Teresina, Piracuruca, Piripiri, Pedro II, São João das Fronteiras, Cocal dos Alves, Cocal, Domingos Mourão e Lagoa de São Francisco e poderia ter sido um reflexo de um tremor ocorrido em Sobral-CE.

Segundo o geólogo Paulo Lages, o Piauí é todo recortado por falhas geológicas e cheio de rochas vulcânicas. As regiões cortadas pelo rio Poti também são delineadas por falhamentos, informou Lages após o tremor de terra que ocorreu na madrugada de um domingo (17/02/2008) em Teresina e em vários municípios do Piauí. Porém, o geólogo não descarta a simples acomodação de camadas subterrâneas.

Mas um destes tremores, de registro muito antigo nos chamou a atenção em particular. Foi narrado no livro Memórias Sobre os Terremotos no Brasil, do cientista imperial Guilherme Schüch (1824-1908), o Barão de Capanema. Encontramos a descrição do estranho terremoto, que teve como epicentro a cidade potiguar de Açu na Cronologia… de Pereira da Costa (1851-1923) e nos seus Anais Pernambucanos, ambos da passagem do século XIX para XX. Este intenso terremoto se refletiu no subsolo piauiense.

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IMAGEM ANTIGA DO MUNICÍPIO POTIGUAR DE AÇU, ONDE OCORREU O TERREMOTO DE 1808. HTTP://GONIMOTITA-SEATEC.BLOGSPOT.COM.BR

Vejamos o que disse Capanema, reproduzido por Pereira da Costa.

“Neste dia se sentiu um ligeiro tremor de terra no Piauí, ao qual se refere o Dr. G. S. de Capanema nas suas Memória Sobre os Terremotos no Brasil, nestes termos”:

No ano de 1808, em 8 de agosto de 1808, pelas 8 horas da manhã, na povoação hoje cidade de Açu ouviu-se um grande estrondo vago, à maneira como um trovão subterrâneo, que se dirigia de leste a oeste, e após ele sentiu-se tremer a terra por algum tempo, abalando as pessoas que mal podiam suster-se em pé e causando choques nos vidros e louças que buscavam sair dos lugares em que haviam sido postos.

Esse terremoto foi sentido em todo o sertão do Açu, da costa em busca do sertão, até mais de 20 léguas, e ao longo da costa até o sertão do Piauí, onde se disse que se atribuiu o terremoto a castigo, por haverem ali umas mulheres torrado uma menina pagã, pondo-a dentro de um tacho sobre brasas, para fazer feitiçarias com suas cinzas! Passando o terremoto, conta-se que ficara o céu nublado de cinza espessa que ofuscara a luz do sol.

Analisando, o terremoto teve como epicentro a cidade do Rio Grande do Norte chamada Açu. Baseado nas descrições do tremor, peritos calcularam a intensidade em 4,8 graus na escala Richter. Este terremoto se refletiu por longa distância a partir de seu epicentro, alcançando as terras piauienses. Correu então o boato de que aqui na Capitania do Piauí o fenômeno fora um castigo por bruxas haverem torrado uma criança para fazer suas artimanhas para agradar o “Tinhoso”. Talvez só boato mesmo ou talvez associaram fatos ocorridos até em épocas diferentes e sem nenhuma relação, fato comum na História nebulosa. De qualquer maneira, se ocorreu o cruel sacrifício, provavelmente a vítima deve ter sido uma criança indígena, reputada como “pagã” pelos colonos.

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IMAGEM ILUSTRATIVA. PACTO COM O DIABO: OFERENDA DE UMA CRIANÇA — FRANCESCO MARIO GUAZZO, COMPEDIUM MALLEFICARUM, 1608. FONTE: MURALDECRISTAL.BLOGSPOT.COM

Porém, o que nos chama a atenção é a última frase, onde se diz: Passando o terremoto, conta-se que ficara o céu nublado de cinza espessa que ofuscara a luz do sol. Ora, a não ser que acompanhado por intensa atividade vulcânica, terremotos não provocam cinzas que deixem o sol nublado e ofusque a luz do sol. Como não há vulcões ativos no Brasil, o que poderia ter jogado tanta cinza na atmosfera a este ponto? Um atavio lendário ao assustador terremoto? Um fenômeno fortiano inexplicável? O “Profeta do Absurdo” Charles Fort (1874-1932) catalogou centenas destas destas ocorrências misteriosas em suas obras. Fica a dúvida, já que os dados são escassos. Infelizmente não temos como saber o que aconteceu de anômalo nos céus do RN e Piauí naqueles idos.

Fontes:

Costa, F.A. Pereira. Cronologia histórica do estado do Piauí. Recife, 1909.

www.wikipedia.org

http://diariodonordeste.globo.com/materia.asp?codigo=524738

http://www.portalaz.com.br/noticia/geral/97543_terremoto_em_nove_municipios_do_piaui_foi_de_35_graus_na_escala_richter.html