A Igreja da Graça da Parnahiba – 250 Anos (1770 – 2020)

Catedral de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça na década de 1940. Parnaíba – PI.

Depois de meio século com a proteção de Nossa Senhora de Monserrathe (1708 – 1758), o arraial da Parnahiba se preparava para a instalação da vila de São João da Parnahiba, ato do primeiro governador da capitania do Piauhy, João Pereira Caldas, que recebera instruções pela Carta Régia de 1759. No Brasil Colônia, tudo era registrado pela Igreja: nascimentos, batizados, casamentos, certidões de óbitos, missas especiais, e até eleições aconteciam com os seus eleitores de paróquia dentro dos templos católicos.

O arraial da Parnahiba contava apenas com uma pequena ermida, não havia igreja e a sede da Freguesia no Norte do Piauí era no povoado de Piracuruca, a mais de vinte léguas, onde estava a majestosa igreja de Nossa Senhora do Carmo datada de 1743. Assim, o séquito governamental saiu da capital Oeiras, com grande comitiva que contava com mais de 200 cavalos, se dirige para Piracuruca, para a solenidade de instalação de São João da Parnahiba no dia 18 de agosto de 1762, ficando a sede da vila no sítio Porto das Barcas, a poucas léguas do mar, como consta na Ata.

Mas com ordens do ouvidor, a sede da vila foi para o pequeno povoado Testa Branca, uma légua distante do Porto das Barcas, ficando assentado o pelourinho neste último. Os parnaibanos resistiram, não construíram casas no Testa Branca, o que forçou o governador a recolocar a sede da vila no sítio Porto das Barcas, ato consolidado pelo segundo governador da capitania do Piauhy, Gonçalo Lourenço Botelho de Castro, no dia 3 de agosto de 1770. Com a determinação do senado da câmara, a vila cobrava impostos no valor de 14$000 réis, para os barcos que atracassem no Porto das Barcas. Parnahiba desde o seu início teve como característica a sua autonomia, despertava para a civilização como símbolo marcante de independência.



Uma das primeiras imagens da Igreja da Graça ainda com apenas uma torre. Do livro do professor português Antônio Neto de Paula A Carreira Marítima Parnaíba – Lisboa, 1998.

Com a consolidação da sede da vila no sítio Porto das Barcas, foi iniciada a construção do templo dedicado, não a São João, mas a Nossa Senhora Mãe da Divina Graça. A pedra fundamental da igreja foi lançada pelos padres Inácio Rodrigues Ferreira e José Lopes Pereira. Em 1777, a igreja foi abençoada com autorização do Bispado do Maranhão. Vinte e cinco anos depois do início da construção, os parnaibanos já contavam com a sua suntuosa igreja. Também no mesmo largo, foi erguido um templo dedicado à Nossa Senhora do Rosário dos Pretos.


Perspectivas da vila de São João da Parnahiba desenhadas em 1809. O largo menor tem ao centro o pelourinho, símbolo do poder da Câmara, e no maior, as igrejas. Tem como autor, Joze Pedro Cezar de Menezes. Fonte: Arquivo Histórico do Exército, Rio de Janeiro.

Muitos moradores da vila de São João contribuíram para construção da igreja da Graça, como João Paulo Diniz. Em 1793, morre um dos grandes beneméritos desse templo: Domingos Dias da Silva. Deixa em seu testamento, vultosa quantia para que seus herdeiros finalizem a grande obra, mas principalmente a sua capela particular do Santíssimo Sacramento, feito que aconteceu sob as vistas do seu filho Simplício Dias da Silva. A igreja era ligada diretamente à Casa Grande dos Dias da Silva por meio de galerias, que chegavam às sacadas, com acesso exclusivo da família.

Decorada com o que de mais fino tinha no reino português, para a sua finalização vieram mestres europeus, peças de mármore de Lioz, alfaias finíssimas, e esculturas de santos executadas pelos grandes mestres de Portugal. Após a sua conclusão em 1795, a imagem da virgem da Graça que aguardava esse momento na igreja de Piracuruca, foi transladada para Parnaíba. Assim, no ano de 1801, o Bispado do Maranhão cria a Paróquia de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça, com esta igreja servindo de Matriz, homologação feita pelo bispo maranhense Dom Luis de Brito Homem no dia 12 de julho de 1805.


Santíssimo Sacramento esculpido em pedra de Lioz no alto do pórtico de entrada da Capela do Santíssimo no interior da Igreja da Graça.


Vitral religioso da Igreja da Graça.


Pórtico de entrada da Igreja da Graça esculpido em Portugal. Traceria em pedra de Lioz com uma rosácea.


Altar mor da Catedral da Graça. Parnaíba – PI.

Pereira da Costa descreve a Igreja da Graça, na sua Cronologia Histórica do Estado do Piauí, 1909, como um dos mais belos templos do Piauí: “A igreja paroquial de Nossa Senhora da Graça da Parnaíba é o melhor edifício da cidade, e se não é o primeiro templo de toda província, é pelo menos rival da bela matriz de Piracuruca. É coberta de lousa, com duas alterosas e elegantes torres, um pórtico de mármore com esculturas, assim como todas as ombreiras e vergas das portas e janelas, pilastras e cornijas, o são interna e externamente, com uma nave de 21m de comprimento, sobre 9,40m de largo, capela-mor e mais laterais, notando-se a do Santíssimo Sacramento pela beleza das obras de escultura de madeira, com dourado finíssimo, tudo isso e suas alfaias riquíssimas, lâmpadas e vasos de prata, pia batismal e lavatório de mármore, e outros objetos de valor e de riqueza dignos de nota. É incontestavelmente a mais rica da província”.


Imagem da Padroeira da Parnaíba na Catedral de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça. Foto: Helder Fontenele.

Em outubro de 1819, chega à vila da Parnaíba, o juiz João Cândido de Deus e Silva. Dois meses depois, fez Proclamação aos Povos da Parnahiba, entendendo que o templo de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça era um local de aprendizado civil, político e religioso, que o povo deveria frequentar: “Aparecei, Cidadãos, vinde ao Templo, conduzi vossas famílias, trazei vossos servos, vinde buscar a instrução que precisais, conhecei e tratai os vossos Concidadãos, amai os vossos semelhantes; ouvi a voz do vosso Pastor que grita e vos convida com doçura; ouvi a voz do vosso Juiz de Fora, que deseja a vossa felicidade com todas as veras, e que só por ela se interessa. Parnahiba 1º de novembro de 1819.”

Nas igrejas aconteciam os grandes eventos religiosos, mas também os sociais e políticos. Em 1820, a Matriz da Graça assistiu as festas realizadas na vila em comemoração ao aniversário natalício de Dom João VI, a elevação do Brasil à categoria de Reino Unido, e à criação da Alfândega da Parnaíba. No seu Largo aconteceu a Proclamação da Independência do Brasil, no dia 19 de outubro de 1822. Também na igreja da Graça, o governador de armas da capitania do Piauhy, João José da Cunha Fidié, depois de invadir a vila para restabelecer a ordem portuguesa, fez celebrar um Te Deum em ação de graça julgando ter destruído o sentimento patriótico do povo parnaibano. Na ocupação da vila pelo sargento Fidié e pelo brigue de guerra Infante Dom Miguel, a igreja foi saqueada. Quando os pernambucanos proclamaram a Confederação do Equador, o padre Francisco de Paula Barros veio do Ceará, e na Matriz da Graça, fez a sua propaganda republicana. A vila aderiu ao movimento no dia 25 de agosto de 1824.

No memorável dia 14 de agosto de 1844, Parnaíba deixava de ser vila e foi elevada à categoria de cidade, pela resolução provincial nº 166. Chegava o ano de 1936, e a igreja da Graça sofria a sua principal reforma sob a orientação do padre Roberto Lopes. Em 1944, Parnaíba celebrou o primeiro centenário como cidade e as grandes solenidades aconteceram no interior da Matriz da Graça que se encheu de júbilo ao saber da criação de seu bispado. Hoje, a Catedral de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça é a sede da Diocese da Parnaíba constituída de vinte e nove paróquias, chegando até a cidade de Pedro II, no Norte do Piauí, administrando quase oitocentas igrejas e capelas.


Catedral de Nossa Senhora Mãe da Divina Graça no Centro Histórico da Parnaíba – PI.