O patrimônio ferroviário de Capitão de Campos pede socorro

Foram 15 anos (1965 a 1980) acompanhando o movimento nesta Estação, meu pai era trabalhador da Estrada de Ferro e morávamos na Vila Ferroviária, era muito movimento, gostávamos muito de morar na Vila. É uma pena ver a Estação abandonada deste jeito. Edileuza Carvalho.

Nos últimos anos, tenho visitado algumas Estações Ferroviárias no trecho entre Luis Correia a Teresina e produzido algumas matérias.

Os links para estas matérias podem ser acessados no final deste texto.

Com a ferrovia desativada já há quase 40 anos, alguns dos prédios destas Estações foram restaurados e hoje servem como centros culturais, museus ou órgãos da administração pública. Infelizmente outros permanecem abandonados, prestes a sucumbirem e levarem consigo uma parte importante da história de cada lugar e também da própria ferrovia como um todo.

No final do mês de julho de 2025, tive a oportunidade conhecer mais uma destas Estações, visitei a Estação Ferroviária de Capitão de Campos, infelizmente este é um dos casos em que o prédio e todo o parque ferroviário apresenta sérios problemas de conservação, principalmente a própria Estação Ferroviária que me pareceu estar totalmente abandonada.

Situação do prédio quando da minha visita em julho de 2025, nota-se um total estado de abandono. Foto: F Gerson Meneses.
Frontão da Estação de Capitão de Campos e a datação de 1950. Foto: F Gerson Meneses.

Em tempo 1: A linha da Estrada de Ferro Central do Piauí foi aberta em 1922 ligando o porto de Luiz Correa à estação de Cocal e depois Piracuruca em 1923. Até 1937, teve um lento prosseguimento até alcançar Piripiri nesse ano. Aí, somente em 1952 chegou a Campo Maior, com os trens de passageiros somente atingindo essa cidade em 1966, e finalmente chegando a Altos e a Teresina em 1969. Os trens de passageiros serviram à estrada até pelo menos 1979. A estrada jamais foi oficialmente erradicada, mas hoje os trilhos já foram arrancados na maioria do percurso, exceto no trecho entre Altos e Teresina, onde a ferrovia faz parte da ligação Ceará-Maranhão (1).

Apesar da datação de 1950, de acordo com (1), somente em 1966 que o trem que passava por esta Estação, passou oficialmente a transportar passageiros, foi quando o trecho da Estrada de Ferro Central do Piauí foi estendido até Campo Maior. O avanço da ferrovia continuou nos anos seguintes, chegando até Teresina no ano de 1969, desta forma, tínhamos uma linha de trem de passageiros ligando Luis Correia (litoral) até Teresina (capital do Piauí). A linha permaneceu ativa durante toda a década de 1970, a partir de então foi “arrefecendo” até a sua total desativação.

Histórica fotografia que mostra o movimento da Estação Ferroviária de Capitão de Campos, não consegui a datação do retrato. Fonte: Acervo Eudemir Ribeiro (in memoriam), foto enviada por Ana Suzane Ribeiro.
O trem parado ao lado da Estação Ferroviária de Capitão de Campos, também não consegui a datação da fotografia. Fonte: Perfil Povoado Sambaíba (Facebook).

O patrimônio ferroviário da cidade de Capitão de Campos não se resume somente ao prédio da Estação Ferroviária, pude observar também uma Vila de casas que originalmente eram ocupadas pelos ferroviários e suas famílias.

A Vila fica no sentido sul, seguindo os trilhos, a cerca de 100 metros da Estação. Foto: F Gerson Meneses.
Vila de casas do Patrimônio Ferroviário de Capitão de Campos. Foto: F Gerson Meneses.

Uma das famílias de ferroviários que morou na Vila Ferroviária, foi a do Sr. Francisco Inácio de Carvalho (in memoriam), ele com a esposa Maria José Alves de Carvalho (in memoriam) e as filhas Edileuza e Elenita Carvalho.

Francisco Inácio de Carvalho, no tempo que trabalhava na Estrada de Ferro. Fonte: Acervo Edileuza Carvalho.

Edileuza, a filha mais velha, atualmente mora em Parnaíba e lembra com saudade dos 15 anos que passou vivenciando o cotidiano da Estação Ferroviária de Capitão de Campos, eles moraram na Vila entre 1965 e 1980, segunda ela:

Chegamos na Vila ainda em 1965, meu pai era funcionário da Estrada de Ferro (eram conhecidos como Cassacos), ele fazia a manutenção dos trilhos…assim que casou em 1965, levou a minha mãe para morar na Vila Ferroviária de Capitão de Campos, logo em seguida em nasci e vivi 15 anos lá, até virmos para Parnaíba para dar continuidade aos meus estudos e da minha irmã, todos nós gostávamos muito de lá…lembro de todos que moravam lá com suas famílias na época. O chefe da Estação era o Sr. Mazullo, morava na primeira casa da vila, em seguida tinha o Sr. Raimundo (Doca) que era o chefe da linha, depois o Sr. Cordeiro, que era o responsável direto para operação da linha e desvios quando os trens chegavam e as demais casas eram ocupadas pelos outros funcionários da manutenção, além do meu pai, moravam também os Srs. Zé Bispo, Nonato e Pedro Veras.

Casa onde morava o Chefe da Estação com a sua família. Foto: F Gerson Meneses.
Casa onde morava o Chefe da Linha com a sua família. Foto: F Gerson Meneses.

Sobre o cotidiano de viver na margem da Ferrovia, Edileuza completa:

O movimento era muito intenso na Estação na época do trem, o trem de passageiros passava todo dia entre 10h30 e 11h da manhã, um dia vinha de Parnaíba e no ou voltava de Teresina, era muita gente vendendo frutas no pátio da Estação, apesar de que no trem havia um restaurante, porque as viagens normalmente eram muito longas e as pessoas comiam no próprio trem durante a viagem…além de passageiros, haviam também os trens de cargas, as vezes passavam com até 10 vagões de cargas, tinha também as máquinas de manutenção da linha e trollers que eram os veículos de manutenção que meu pai trabalhava…lembro de todos os trens, inclusive a Maria Fumaça que era movida a lenha…a nossa família gostava muito de lá, só veio para Parnaíba porque nós tínhamos que estudar e meu pai pediu transferência, ainda trabalhou uns anos aqui em Parnaíba, até se aposentar.

Antigo trollher, veículo de trabalho do Sr. Francisco Inácio de Carvalho. Este este está exposto no pátio da Estação Ferroviária da Cidade de Bom Princípio – Piauí. Fonte: Edileuza Carvalho.

Quando o Sr. Francisco Inácio de Carvalho se aposentou em 1988, a Estrada de Ferro Central do Piauí já estava vincula à REFSA – Rede Ferroviária Nacional. Foi da REFSA que ele recebeu o agradecimento pela esforço, lealdade e competência durante os vários anos que passou trabalhando na Estrada de Ferro.

Certificado de agradecimento recebido pelo ex-ferroviário Francisco Inácio de Carvalho. Fonte: Acervo Edileuza Carvalho.

Restauração e aproveitamento do prédio:

Sobre a restauração e aproveitamento do prédio da Estação Ferroviária de Capitão de Campos, em 2019 circulou na imprensa (2) uma informação de que o velho prédio seria transformado em biblioteca e em um museu, pelo jeito o projeto não foi pra frente, a ideia é excelente, resta torcer para que aconteça antes que a edificação sucumba de vez.

Referências citadas:
1 – http://www.estacoesferroviarias.com.br/ma-pi/capitao.htm – Acesso: 17/09/2025
2 – https://www.gp1.com.br/blog/celso-oliveira/2019/1/25/estacao-de-trem-sera-transformada-em-biblioteca-em-capitao-de-campos-400722.html – Acesso: 17/09/2025

Links citados:

Recortes históricos sobre o centenário da Estação Ferroviária de Piracuruca

Um breve passeio pela Esplanada da Estação Ferroviária da Parnahyba

Sr. Raimundo Luiz de Carvalho, o guardião do patrimônio ferroviário de Bom Princípio do Piauí

Os últimos vestígios do patrimônio ferroviário de Frecheiras de São Pedro – Cocal – PI

A charmosa estação de trem de Floriópolis em Parnaíba – Piauí

Povoado Deserto: um patrimônio histórico, cultural, econômico e social de Piracuruca – 1ª Edição